Faz manchete na edição de hoje do jornal Correio da Manhã a seguinte noticia:
Várias dezenas de ex-goverantes e deputados, além do Presidente da República eleito, recebem reformas chorudas do Banco de Portugal, atribuídas após apenas cinco anos de serviço. Além de uma pensão escandalosa, os contemplados mantêm todas as regalias concedidas aos administradores no activo, ou seja, carro e cartão de crédito.
Entre os beneficiários, conta-se Campos e Cunha, ex-vice-governador do Banco de Portugal e detentor, como tal de uma reforma de oito mil euros, Miguel Beleza, ex-ministro das Finanças no primeiro Governo de Cavaco Silva com 3.062 €, o próprio Cavaco Silva, que chegou a ser técnico consultor de nível 18B, saindo com uma reforma de 2.679 € e Octávio Teixeira, ex-técnico consultor de nível 18ª no Banco de Portugal, que deixou a instituição com uma reforma de 2.385 €.
Estranha-se que Cavaco Silva não tenha denunciado esta flagrante situação de escandaloso privilégio e recusado a mesma.
25 janeiro 2006
Estranha-se
Marcadores: Primo de Amarante (compadre Esteves-JBM)
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10 comentários:
Talvez (a gente) não estranhe!
A honestidade esteve sempre para a politica, como a virgindade para o casamento. E tanto num caso como no outro, havia sempre quem recorresse ás "plásticas".
É tudo uma questão de boa moeda!...
E eu pergunto: os outros candidatos falaram sobre o assunto? Ou não será que todos eles são "assalariados" do Estado, de uma ou de outra forma (excepto Garcia Pereira)?
Desconhecia que um deputado pudesse ser considerado "assalariado" do Estado. Ou que um ex-presidente da república também assim fosse considerado. O que me espanta é a inconsciência disto. Ou acharão que os deputados devem estar lá de borla e os presidentes não devem ter direito a reforma?
Portugal já é suficientemente original ao decidir acabar com o funcionalismo público (é mesmo o único país do mundo que resolveu isso) gradualmente (acabaram os concursos de entrada como sabem e agora os funcionários são copnsiderados "residuais" (sic).
quanto ás reformas já outro galo canta: parece que se esqueceram de alguns nomes. Não vou dizer nada não aconteça dizerem que é por ser de esquerda...
O tempora! O mores!
Meu caro MCR, estou plenamente de acordo consigo, talvez com outros contornos mas, no essencial, estamos de acordo.
Como cultor do Direito Administrativo, apaixonado por este ramo do Direito, dói-me a utilização do direito privado pela Administração Pública, a qual irá produzir necessariamente alterações naquele.
Dada a complexidade da nossa actual sociedade, o Estado sentiu necessidade de alicerçar as suas decisões na ponderação dos interesses em presença e, a tradicional limpidez da distinção dos interesses, públicos e privados; relativizou-se. Ao fundar a acção do Estado-Administração no princípio da proibição do arbítrio, densificado pelos valores emergentes da ordem jurídica, princípios como o da eficácia e da eficiência, da ponderação dos interesses, da racionalidade, a legitimidade para agir ganhou um certa indeterminação. A acção administrativa deixa de basear-se numa norma expressa, sectorial, do ordenamento jurídico, naturalmente uma norma administrativa, para passar a basear-se no Direito em geral. O que vai implicar a diluição das esferas pública e privada do Direito. Ora, a legitimação do poder do Estado é, em si mesma, a razão de existir do direito público.
Não sei se não estaremos perante um paradoxo: Há pouco mais de cem anos foi “inventado” o Direito Administrativo” porque o Direito Privado não era adequado para garantir a prossecução do interesse público. Nos nossos dias, há uma “fuga para o Direito Privado” sob o pretexto de que o Direito Administrativo não seria suficientemente eficaz para alcançar o interesse público.
Creio firmemente que existe uma influência de interesses particulares, que pretende “colonizar” o interesse geral da colectividade.
Afinal, estamos em presença de dois modelos económicos e sociais; por um lado, desvaloriza-se o acto administrativo e os contratos administrativos, nega-se a validade de um regime especial de responsabilidade da Administração, os funcionários públicos, hoje os “culpados” do estado caótico em que a Nação mergulhou, deverão abraçar a nova realidade do Direito do Trabalho, defende-se a eliminação do domínio público, a privatização dos hospitais, dos serviços de segurança pública; advoga-se a privatização da Segurança Social.
Mas negamos este paradigma: não nos parece que o enfraquecimento gradual do Estado e dos seus serviços necessariamente públicos venha a gerar a tão propalada prosperidade para os cidadãos.
É certo que a gestão pública actualmente deixa muito a desejar pois as estruturas da máquina administrativa, tendo sido intencionalmente destruídas e desarticuladas há trinta e um anos, é hoje com frequência ineficiente. Mas a culpa não está necessariamente no Estado, nos respectivos funcionários, ou no regime jurídico delineado pelo Direito Administrativo para defesa da colectividade.
A culpa cremos que está não na ausência de um sistema da gestão privada na Administração Pública, mas na gestão que qualificaria, sem pruridos, de danosa da coisa pública por parte dos sucessivos (des) governos após Abril de 1974. E não por uma súbita incapacidade por parte do Direito Administrativo de, através dos seus mecanismos dotar o Estado de mais agilidade, maior capacidade de resposta às necessidades dos cidadãos.
Como escreveu há pouco tempo, em artigo de jornal, intitulado “Os incêndios do regime”o historiador Paulo Varela Gomes, na III República deu-se “ o colapso da autoridade do Estado central e local, este regime de desrespeito completo pela lei, que começa nos ministros e acaba no último dos cidadãos. É o território do incumprimento dos planos, das portarias e regulamentos camarários, o território da pequena e média corrupção, esse sangue, alma, nervo da III República” – in Jornal Público de 11 Agosto 2005.
Nem mais!
Dada a complexidade da nossa sociedade actual e a emergência de novas filosofias preconizando a mudança de paradigma do Estado e redefinição das suas funções parece “exigir”, entre outros desideratos, que se introduza na esfera da Administração Pública a possibilidade de recurso ao contrato individual de trabalho.
Preconiza-se a adopção de um novo modelo de Administração Pública, que deve apostar em menos Estado e melhor Estado.
Pretende-se que haja uma nova cultura e uma nova atitude da Administração perante o cidadão. Todos os dias políticos, jornalistas, sociólogos da nossa praça afirmam com ar ameaçador que esta existe para servir e ser útil às pessoas.
Curiosamente, nos dias que correm, insiste-se muito nesta ideia, como se fosse algo de novo. Na verdade, já o Prof. Marcello Caetano afirmava que “ O funcionário é um servidor da Administração, mas é também um servidor do público cujos interesses afinal a Administração tem de zelar” (sublinhado nosso) - Prof. Marcello Caetano, “Manual de Direito Administrativo”, Vol. II, fls.747.
Mais claro que isto é impossível!
Fui buscar à livrada este belo excerto de Pedro Theotónio Pereira. Na bruma da História, e para os vindouros (que desta pouco ou nada sabem), ficou exarado, por este, que “não faltavam no serviço público funcionários de comprovada competência e grande devoção pelas tarefas que lhe estavam confiadas” – in Pedro Theotónio Pereira, “Memórias – Postos em que servi e algumas recordações pessoais”, Volume I, 2ª edição, Verbo 1973, fls. 213.
"
Hoje, os nossos políticos (em geral) apenas “batem” nos pobres coitados..com tanta gente capaz e competente que lá existe!!!
É muito debatida a questão do Estado ser demasiado extenso e de a nossa sociedade civil estar atrofiada. É necessário termos menos Estado e melhor Estado e uma sociedade civil mais forte, diz-se.
É claro que o Estado, para os defensores desta visão, deveria “entregar” certos sectores à sociedade civil, como a prestação de cuidados de saúde e a educação e cuidar da justiça, que não é privatizável e é uma prerrogativa da soberania.
Todos sabemos, é um facto indesmentível, que o Estado (leia-se os homens que hoje se servem da máquina administrativa para os seus fins menos lícitos…) desperdiça muito, quer na prestação de cuidados de saúde, quer na prestação da educação. Assim sendo, seria talvez desejável que o Estado entregasse à sociedade civil esta responsabilidade, que lhe assiste como direito, já que é uma responsabilidade primeira da sociedade civil e da família. Nada impede que aquela desempenhe esse papel. Todavia, cremos que o Estado nunca deverá alhear-se dos seus deveres nesta matéria, atentas as prestações “mínimas” que deverá assegurar nestes domínios, mesmo que a título subsidiário. Tal não nos choca. Aliás, essa actuação deve ter carácter de orientação, de estímulo, de coordenação, e há-de inspirar-se no princípio da subsidiariedade, formulado em 1931 por Pio XI na sua Encíclica “Quadragesimo Anno”.
Também João Paulo II enfatizou este princípio da subsidiariedade, considerando que o Estado deve criar as condições favoráveis para o livre exercício da actividade económica e que “uma sociedade de ordem superior não deve interferir na vida interna de uma sociedade de ordem inferior, privando-a das suas competências, mas deve antes apoiá-la em caso de necessidade e ajudá-la a coordenar a sua acção com a das outras componentes sociais, tendo em vista o bem comum”.
Todavia, afirmou ainda o santo Padre que devem nortear-nos “códigos éticos e instrumentos jurídicos mediante os quais se possam enfrentar as situações cruciais para poder eliminar o antigo drama pelo qual são sempre primeira e mormente os mais débeis a pagar”
Ainda o citamos neste passo importantíssimo: “Também no campo financeiro e administrativo é necessário ter sempre como objectivo jamais violar a dignidade do homem, construindo para isto estruturas e sistemas que favoreçam a justiça e a solidariedade para o bem de todos”.
Ora, e em consonância, o Estado deverá ter um poder regulador e fiscalizador. Ele não pode alhear-se do que se passa na sociedade. A defesa de um modelo de Estado com um papel supletivo e subsidiário da sociedade civil é de uma enorme exigência para o próprio Estado, porque o obriga a ter uma atenção redobrada sobre a sociedade civil para intervir quando esta não for capaz, por si só, de resolver os problemas dos cidadãos.
Mas o Estado deve ser ágil, porque esta é uma função que exige uma estrutura da Administração Pública, por exemplo, muito competente, muito leal e servidora, muito atenta e muito ágil. Temos, como acima já se infere, uma Administração Pública pesada, carecida de aperfeiçoamento de competências e que não é muito eficiente. Diga-se que também é necessária uma maior autonomia da Administração Pública face às forças partidárias porque tem havido uma excessiva apropriação partidária do aparelho do Estado.
É desta actual indefinição do papel do Estado que surge um horizonte muito sombrio, pois não existe ordem social sustentável sem que existam leis e instituições em que a sociedade se reveja.
Tudo passa pelo papel que pretendemos que o Estado desempenhe na sociedade.
O Estado hoje encontra-se muito enfraquecido. É natural. Apesar deste continuar a ter um papel essencial nas sociedades de hoje, a globalização torna os Estados-nações fracos face às empresas multinacionais; e os blocos de Estado sobrepõem-se aos Estados nacionais. A ideologia liberal assenta na ideia de "menos Estado, melhor Estado". O que se pretende, porém, não é tanto a redução do papel do Estado, mas antes a sua reconfiguração. Interesses privados querem apropriar-se do Estado, o que é particularmente evidente em Portugal. Hoje, em nome da competitividade, assiste-se a mudanças que distanciam o Estado dos cidadãos; pondo em causa a função social do Estado.
Ora, veja lá, MCR, o que deu o seu comentário acerca do funcionalismo público…
Um Abraço!
dlmendes
Assalariados com aspas, caríssimo.
Meu caro DLM
fico-lhe gratíssimo pelo seu excelente comentário que, sobre ser claro, me parece rigoroso.
Meu caro Carteiro
eu vi as aspas mas V. concordará que, num momento em que se arreia forte e feio em todos os olíticos como se a inexistência deles não conduzisse á mais execrável tirania, todos os cuidados de linguagemsabem a pouco.
Já aqui o disse e repito: o facto de estar no parlamento tem de ser honrosamente compensado sob pena de só concorrerem os piores e menos aptos, de ser pasto de corrupção passiva e alvo da risota geral.
Esquecemo-nos que o parlamento deve ser o espelho do país e o alfobre dos líderes desse mesmo país.
Ora aqui estava um terreno bom para mais um excelente comentário do "nosso" (com aspas) DLM
Abraços a ambos
Como, segundo alguns comentadores, só Cavaco é o supra-sumo da honestidade e do rigor, só se esperaria que fosse ele a falar do assunto. Não falou, mas vai-lhe ficando o proveito: pode acumular todas as reformas, menos a de primeiro-ministro, o que lhe vai dar a módica quantia de 12mil e tal euros por mês.
E, como o ordenado de Presidente da República representa o tecto dos salários da função pública, esperamos que exija uma subida proporcional de todos os vencimentos, por forma a que tal tecto não abrigue apenas alguns.
O princípio do rigor é também um princípio da proporcionalidade equitativa. Ou será que a boa moeda só conta para alguns!?...
E então os outros não eram campeões do rigor e da honestidade, compadre? Mas olhe que tanto quanto sei, as reformas e o vencimento de PR não são acumuláveis... Pelo menos por inteiro.
Os outros não fizeram disso uma bandeira de um estilo de presidir á República, nem tinham que o fazer, pois isso é uma obrigação linear. Por outro lado, os seus apoiantes transformaram isso num caso singular de um candidato, justificando com isso a necessidade da sua eleição. O que é, como se vê pelas acumulações, caricato.
A acumulação está publicada nos jornais e no DD.
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