A reflexão de fim de semana leva-me a reconhecer que a minha vida tem sido uma sucessão de equívocos. Equivoquei-me em relação a várias pessoas em quem confiei e em relação a alguns dogmas, porque acreditei piamente em certezas absolutas que se revelaram um logro e que estouraram nas minhas mãos como bombas de carnaval. Em todos os casos saí magoado.
A última mágoa é talvez a mais prosaica. Quando estudei direito, nunca coloquei a hipótese de ser magistrado, ainda que o meu pai tivesse gostado que eu fosse. Mas eu achei que não estava talhado. Os meus colegas que apontavam para a magistratura eram pessoas bem comportadas, e eu era um boémio na boa tradição coimbrã. Eles iam às aulas e estudavam, eu ia pouco e estudava pouco (estudei muito depois de acabar o curso). Eles viam livros de direito apenas e eu andava já pelos jornais. Eles fugiam da política a sete pés e eu andava na agitação política. Eles namoravam muito certinho e eu praticava crimes de invasão de lugar vedado ao público (quando entrava nos lares pelas janelas). Em suma: eu sentia que não estava em estado de pureza bastante e que era um miúdo demasiado rebelde para ser o magistrado impoluto, ponderado e inatingível que preenchia o meu imaginário.
Olho para trás. E para a frente. Olho para o país descrente. Olhos todos os dias para os meus clientes descrentes, pessoas que já não olham para os magistrados como uma casta em que se pode confiar cegamente. Tento persuadi-los do engano, não porque sim, mas por convicção. Uma convicção que, dia-a-dia, se vai diluindo. Não porque tenha razão de queixa nos problemas concretos (as excepções são poucas), mas porque, indo por aí abaixo, no blog, vou lendo o que magistrados pensam de magistrados e pela forma como se assume que há promiscuidade entre o poder político e os magistrados. Não sou eu que digo. São os próprios. Pelo menos alguns. E a minha sensação de uma vida de equívocos regorgita.
Afinal, eu era suficientemente puro para ser magistrado (não estou arrependido de não ter ido por aí). Afinal, eu sou é demasido crédulo. E um ingénuo...
(Tudo isto faz-me recordar a minha última conversa com Avelino Ferreira Torres, esse grande vulto da democracia. No outono de 2001, adversários políticos, ele disse-me uma coisa que me aterrou sobre magistrados. Não consegui esconder a revolta. Mas, afinal, ele devia saber do que falava...)
2 comentários:
Pois, tem razão. Mas eu não digo. Ainda não perdi o juízo por completo...
Isto só melhora quando a Matemática e a Física forem as disciplinas nuvleares de acesso ao Direito !
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