02 julho 2006

Portugal Hoje

De quando em vez, é preciso descansar um pouco. O terreno até está propício para um certo pousio... Contudo, aqui deixo, com a (certamente) bondosa condescendência da "minha" Kami, um texto da Ana Lucinda, a propósito da nossa Selecção e...não só. Como estamos ambos em sintonia perfeita, aqui deixo, pois, o seu texto, que subscrevo na íntegra.


"Eu vi a luz brilhar nos olhos dos portugueses. Ricos, pobres, incluídos e excluídos, novos e velhos ostentavam a bandeira nacional e gritavam vitória. Todos transbordavam de emoção e de sonho. Eu vi!

O pretexto foi a vitória da selecção portuguesa no jogo de futebol contra a selecção inglesa.
Nesta época de globalização em que o poder económico destrói as fronteiras e se debilitam os poderes institucionais, há fenómenos que fazem eclodir, numa avalanche, a nossa identidade nacional, a nossa alma portuguesa.

Como atrás de tempos vêm tempos, as Nações e os Estados não estão definitivamente realizados, mas têm de cumprir-se constantemente.

É preciso dar corpo a esta Alma e cumprir Portugal hoje e agora!

É preciso cumprir Portugal promovendo políticas de fixação das populações à sua terra.

É preciso evitar a desertificação do interior, o que significa efectivar Portugal em toda a sua área geográfica. Portugal não pode confinar-se às grandes cidades do litoral!

Vem isto a propósito da anunciada intenção de extinguir as comarcas judiciais e de as substituir por novas "circunscrições territoriais", o que se insere na actual política que redunda na extinção dos organismos públicos desconcentrados.

Com o encerramento das fábricas por via da “deslocalização” e do “dumping social”, e a extinção destes organismos públicos por causa das restrições orçamentais, como é possível cumprir Portugal na sua dimensão geográfica?

Convém não esquecer que o deficit orçamental não se controla só com a redução da despesa pública. O deficit orçamental está em íntima relação com o produto interno bruto (PIB) e, se não houver crescimento económico, se não houver PIB, pode chegar -se a um momento em que a despesa pública tem de ser zero, acabando todas as funções sociais do Estado.

Se a verdadeira causa da redefinição do mapa judiciário é apenas o desajustamento do volume processual aos recursos existentes nas diversas comarcas, então agreguem-se as comarcas, ficando um juiz afecto a duas ou três, reformule-se o quadro dos funcionários judiciais em função do volume processual, aproveitando-se estes funcionários judiciais excedentários para outros serviços públicos, desconcentrados ou locais.

Auscultem-se as populações, ouçam-se os funcionários, os juízes, os magistrados do Ministério Público, os advogados. As reformas são necessárias na dialéctica do tempo que tudo muda. Mas as mudanças têm de ser feitas em favor das populações e têm de incluir todos os visados, numa atitude de integração, de construção, e não de destruição.

O Estado de Direito democrático não se esgota numa maioria governativa e parlamentar!

Não se extingam os factores de fixação das populações à terra. Não se destrua todo um edifício jurídico construído, ao longo de muitas décadas, por insignes Juristas, e que assenta, ao nível político e administrativo, na desconcentração e descentralização dos serviços do Estado e entes públicos, aliás na esteira do universal princípio da subsidiariedade que avivou de tom com a integração europeia.

Portugal mostrou que precisa absolutamente de afirmar a sua identidade nacional e quer cumprir-se na sua integralidade, o que se revela essencial na sua actual condição de Estado membro de uma União Europeia a navegar em mar tempestuoso.

Portugal tem um porto seguro que é o sentido de identidade nacional, a coesão territorial e o seu património histórico e cultural.

É necessário que os políticos, como representantes deste povo, percepcionem este grito de Alma e contribuam para que Portugal se cumpra."

Ana Lucinda

6 comentários:

Kafé Roceiro disse...

Gostei muito desse blog. Convido-te para conhecer o meu e dar seu palpite. Se topar trocar links é só dizer.
abraço,
Kafé Roceiro - Humor e Cinema.

M.C.R. disse...

Goya dizia que o sono razão desperta monstros.
não conhecia o futebol. Se conhecesse acharia o texto referido um pouco sonolento.
Vamos lá a ver ganhar ao futebol é agradável mas não melhora nem piora a identidade nacional. sobretudo se amanhã ou depois a equipa nacional perder com a França. As multidões ululantes não passam de multidões ululantes. Enfurecidas inventam a lei de Lynch, calmas, emborracham-se.
No que toca á desertificação ela não depende nem de tribunais nem de juristas. Depende do facto de alguém pensar que não vale a pena viver no mato. A desertificação do interior não se combate permanecendo lá uma inutil repartição. O que lá deve permanecer é trabalho para quem dele precisa. Trabalho. Ou seja pode perfeitamente conceber-se que ºpara atrair uma fábrica o governo lhe baixe os impostos se ela for para Quadrazais do Meio. que inclusive baixe o IRS a quem lá viva. Não confundamos políticas de desenvolvimento local com a perman~encia de um tribunal Ou de um hospital sem doentes. Ou de uma escola sem alunos.

C.M. disse...

“Peço desculpa” Marcelo, de ter colocado aqui o texto da Ana, o qual ela enviou para os jornais, para publicação.

Achei o texto dela muito interessante, vivo, brilhante mesmo, e pensei que o mesmo poderia enriquecer o debate acerca das questões nele colocadas.

Por isso o coloquei aqui.

Mas constato que me “equivoquei”. Sei que, entre amigos, (creio) não são necessários comentários deselegantes.

Kamikaze (L.P.) disse...

Na verdade, MCR, o excesso de vinagre estraga ate a melhor das iguarias. E logo voce que costuma ser tao bom no tempero! Sera que ainda da para rectiificar os condimentos?

M.C.R. disse...

Não quis de forma alguma ser deselegante nem ofender quem quer que seja embora lendo melhor o texto ele possa dar essa ideia. O que pretendi foi -se me permitem - criticar a actual euforia futebolistica. acho terrivel que duas ou três vitórias ao futebol desiquilibrem uma balança bastante má.
A segunda questão é esta: eu sou funcionário publico e tenho a função pública como uma instituição respeitável. Todavia continuo a entender que o desenvolvimento do país não se pode fazer criando ou mantendo instituições e funcionários públicos. Acontece que - pelo menos eu li-o assim o texto vem dizer que o actual estado das comarcas e a sua situação é bom. Não é. A geografia modificou-se e há tribunais inuteis em sítos que estão a sofrer erosão continua de população. Por outro lado há locais que cresceram exponencialmente e estão privados de infra-estruturas públicas que não se criam porque o governo e os burocratas da economia acham que há
função pública a mais. Tenho pois por certo que a leitura simples do texto que critiquei (simples, digo) possa induzir em erro os leitores apressados. Se calhar fui um deles. disso peço desculpa.
quem me costuma ler sabe que não sou pessoa para ofender quem quer que seja, antes pelo contrário. Sou, isso sim, um fulano que diz exactamente o que pensa e que por isso mesmo tem sofrido na pele esse excesso de verdade.
finalmente o formato comentário obriga a resumir o que se pretende dizer -ao contrario dos postais (sobretudo os meus) onde se pode temperar cuidadosamente o que se quer dizer. Também disso me devo desculpar.
finalmente desconhecia a identidade da autora do texto. Se é quem eu penso uma nova e dupla desculpa: das conversas agradabilissimas que com ela tive fiquei com a ideia de uma pessoa doce, inteligente e com os pés na terra.

C.M. disse...

Pode-se discordar das ideias defendidas no texto. Mas objectivamente, em termos jornalísticos, o texto não foi considerado sonolento, pois foi publicado, no "DN" de hoje, com algum destaque.

A emenda foi pior que o soneto. Tenho dito e por aqui me fico!