20 julho 2006

Um "comandante" para o Ministério Público?

Por Eduardo Maia Costa, Procurador-geral Adjunto, no blawg Sine Die
(sublinhados meus)
Segundo o Bastonário da Ordem dos Advogados o novo Procurador-geral da República deve ser um "verdadeiro comandante". Estas palavras são equívocas e podem ser interpretadas no sentido de que é necessário um reforço da hierarquia do MP. Se for esse o sentido das palavras do BOA, devo dizer que discordo frontalmente.
Sempre me opus a uma visão administrativista do MP, sempre considerei essencial à boa administração da justiça, pelo menos a uma justiça imparcial e independente, características essenciais e indispensáveis de uma boa administração da justiça, um MP judicial, um verdadeiro órgão de justiça e não um órgão da administração pública.
Creio que a análise dos diversos sistemas existentes demonstra inequivocamente que a proximidade do MP em relação ao executivo é directamente proporcional à dificuldade na afirmação da justiça como poder independente. É sempre através do MP, "elo mais fraco" do poder judicial, que são veiculadas, com maior ou menor visibilidade e eficácia, as tentativas (legítimas e ilegítimas) de interferência na justiça.
Não basta, porém, a autonomia externa; só um grau mínimo de autonomia interna, de autonomia de acção e decisão de cada membro do MP, garante a judicialidade do MP e consequentemente a salvaguarda dos valores que lhe compete defender.
Por isso, creio bem que o MP português não precisa de um "comandante" (com a inevitável conotação militar ou policial que essa palavra envolve), nem de um dirigente carismático (experiência já vivida e que não deixou saudades), mas de um PGR que se entusiasme e entusiasme os seus subordinados no cumprimento das suas funções constitucionais e estatutárias, que saiba despertar e canalizar energias para as dificuldades e problemas, que saiba encontrar novos métodos de trabalho e organização, que privilegie o diálogo e a discussão, em detrimento do "direito circulatório", que saiba mobilizar toda a magistratura para enfrentar a crise em que está mergulhada.
O PGR não é o MP. É apenas o seu dirigente máximo e porventura o seu "alvo" mais exposto. Tem um estatuto ambíguo, não isento de fragilidades. Sem os magistrados do MP, no seu conjunto, não "vai lá". É preciso que o próximo PGR tenha consiência disso.

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