O tema da corrupção reentrou em força na agenda política. Tinha-se insinuado como tema premente numa intervenção de Jorge Sampaio e agora foi retomado, com muito mais realce e intensidade, por Cavaco Silva. Pelo seu lado, o novo PGR, Fernando Pinto Monteiro, na sua tomada de posse, pegou igualmente no tema. E se Cavaco Silva já tinha acertado em alguns alvos, o novo PGR apontou baterias para aspectos que considero fundamentais:
1º - Há que deixar de banalizar a corrupção. Mudar a imagem actual de “um mal menor”;
2º - Não esperar por novas leis e/ou meios para fazer o que é possível fazer-se.
Relativamente à primeira questão, a da banalização, é de facto um problema gravíssimo pelo seu enraizamento forte na cultura dos portugueses. É frequente ouvir-se: “Ok, todos sabemos que ele (político x) é corrupto, mas pelo menos tem obra feita!”; ou então “ É melhor pagares a (funcionário público y) caso contrário nunca mais vês o processo despachado”.
Todos conhecemos estas e outras frases parecidas. A corrupção dos detentores de cargos públicos, quer ao nível dos políticos quer de funcionários, é vista como uma realidade incontornável e com a qual nos habituamos a viver.
Há dias, numa entrevista na televisão, um conhecido actor brasileiro à pergunta se tinha gostado que Lula tivesse que ir a uma segunda volta, respondeu que tinha voltado nele nas anteriores eleições, mas agora não. Referiu que estava desgostoso, que o PT já não parecia um partido mas sim uma quadrilha de malfeitores. Quando lhe perguntaram se no Brasil havia muita corrupção entre os políticos respondeu” Não gosto de generalizações. Os políticos não são todos corruptos, mas que está difícil saber quem não o é, lá isso está!”
É uma grande verdade e é uma imagem perigosa.
Para salvaguardar os que não são corruptos e para construir uma democracia com o mínimo de justiça é fundamental, de facto, retirar à corrupção o seu estatuto de normalidade e destacá-la com algo de anormal, com punições marcadamente visíveis e proporcionais. E todos podemos também fazer alguma coisa a esse nível, basta, por exemplo, não embarcarmos no pagamento das chamadas “pequenas” corrupções, e se possível desmascará-las.
Quanto ao segundo aspecto que destaquei do discurso do novo PGR, acho notável que num pais onde a grande maioria perde o seu tempo a explicar/justificar porque não faz determinada coisa, assumindo um papel permanente de vítima e de desresponsabilização, apareça alguém, detentor de um cargo de tão elevada responsabilidade, a dizer que é possível actuar com os meios e as leis disponíveis!
Apesar dos prognósticos, como é sabido, só se deverem fazer no final do jogo, não posso deixar de augurar um desempenho muito positivo, assim os actos acompanhem as intenções.
10 outubro 2006
Na agenda política
Marcadores: O meu olhar
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4 comentários:
Ouviu ontem o Prof. Costa Andrade no Pró e Contras?
Ouviu??
Faço meus os seus votos, apesar de incrédulo...
Excerto de editorial de Eduardo Damaso, no DN
"O momento decisivo de avaliação será em Abril de 2009, quando se fizer o primeiro balanço da lei das prioridades da investigação criminal. Se persistir o tempo médio de duração das investigações em casos de criminalidade económica, muito superior a dois anos, então Pinto Monteiro nada terá para apresentar no Parlamento a não ser mais umas estatísticas de processos pendentes e arquivamentos. Para quem vai trabalhar com os meios que existem e provavelmente um orçamento sem crescimento ou mesmo inferior, os amanhãs não parecem muito sorridentes.
Depois, também não ajuda que no dia em que o novo PGR pede aos portugueses uma especial censurabilidade em relação à corrupção se fique a saber que esta, na versão de quem corrompe, e o tráfico de influências fiquem fora da prisão preventiva. É um sinal desastroso que se dá à comunidade. Não têm sido nestes domínios os abusos da prisão preventiva e é muito no terreno dos crimes económicos que se joga uma outra coisa que Cavaco Silva também pediu ontem e é decisiva para a imagem pública da justiça: igualdade na aplicação da lei. Pinto Monteiro conta, portanto, com a sua determinação para mudar alguma coisa, mas os tempos não jogam a seu favor. "
Cara Kami, é de facto verdade que os tempos não jogam a favor, quer ao nível dos meios quer do enquadramento, de quem quer, de alguma forma, intervir contra a corrupção que cresce em flecha neste país. Mas dizer que se pretende fazer alguma coisa merece no mínimo, do meu ponto de vista, o benefício não da dúvida mas da espera… para ver.
Cara Cleópatra, não ouvi o Prof. Costa Andrade no Pró e Contras porque esgotei a paciência para a falta de profissionalismo da entrevistadora responsável por esse programa. Posso até dizer-lhe que ela me chega a irritar pelo facto de ter por hábito não deixar desenvolver as intervenções dos convidados, nomeadamente quando começam a ter algum interesse. É uma queda que ela tem… o que se há-de fazer?
Não ouvi mas fiquei curiosa de saber o que realça da intervenção do Prof. Costa Andrade. Se tiver a amabilidade de o partilhar, agradecia sinceramente.
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