03 novembro 2006

Posso quero e mando

Resultado da votação na sessão de hoje do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) relativa à nomeação do Procurador-Geral Adjunto Gomes Dias para o lugar de Vice-Procurador Geral da República:

votos contra-------5 (9 na votação do dia 9/1)
votos em branco---2 (1 na votação ocorrida no dia 9/10:1)
abstenções---------3 (por considererem ilegal esta 2ª votação)
faltaram ----------1 (Rodrigues Maximiano, procurador-geral adjunto nomeado para o CSMP pelo Ministro da Justiça e que, na sessão do dia 9/10, se pronunciara contra Gomes Dias - faltou por motivo de força maior; na sessão do dia 9 faltara, por razões de serviço, João Rato, Procurador da República eleito -pelos seus pares, um dos que hoje se recusou a votar)
Votos a favor:------8 (8 na votação do dia 9/1)
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O PGR Pinto Monteiro, que abriu a sessão do CSMP agitando o cenário dramático (?) da sua demissão caso Gomes Dias não "passasse" não conseguiu, ainda assim, nem mais um voto a favor deste; conseguiu sim mais um voto em branco e... 3 abstenções! Mas conseguiu o que queria: ser coadjuvado por um magistrado que está há 20 anos afastado dos tribunais mas, em contrapartida terá feito tão estreitos laços com influentes personalidades do bloco central que há mesmo quem afiance que o seu lugar como vice fez parte daquela parte do Pacto da Justiça que permanece na sombra. Mas isso não interessa nada. O que interessa é que Pinto Monteiro já averbou no seu currículo ter "dobrado" o CSMP, o tal que antes era tido como um garantia de democraticidade no governo do MP e agora, num passe de mágica, passou a ser tido como força de bloqueio das reformas anti-corporativas.
É caso para saudar o espírito democrático demonstrado por Pinto Monteiro nestes sucessos e o espírito de missão demonstrado por Gomes Dias ao aceitar ser nomeado nestas circunstâncias. E para augurar tempos ainda mais difícieis no alcançar de uma justiça cega.
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No Sol on line

"Ao fim de quase três horas de discussãoo Conselho Superior do Ministério Público acabou por deixar passar o nome de Mário Gomes Dias para vice-procurador-geral da República.,
O magistrado - que há duas semanas fora chumbado por nove votos contra oito - foi agora eleito com oito votos a favor, cinco contra e dois brancos. Três dos 19 membros do Conselho – o advogado João Correia e os procuradores João Rato e Helena Pinto – recusaram-se a votar, por considerarem que a repetição da votação era ilegal.
O procurador-geral da República, Pinto Monteiro, abriu a reunião do Conselho por volta das 11h. «Um voto contra Gomes Dias é um voto contra mim» - foi a forma como voltou a submeter à apreciação do Conselho o nome daquele magistrado para seu número dois.
A intervenção suscitou protestos, nomeadamente do advogado João Correia (membro eleito pelo Parlamento), que lembrou já ter esclarecido publicamente que votara contra devido ao currículo de Mário Gomes Dias.
Este magistrado é auditor jurídico no Ministério da Administração Interna há mais de 20 anos, estando afastado do dia-a-dia da magistratura do Ministério Público.
Seguiram-se outras intervenções, umas defendendo a legalidade da repetição da votação, outras contra. Houve até quem sugerisse que o PGR aguardasse pela alteração ao Estatuto do Ministério Público – que Pinto Monteiro disse já ter garantida da parte do Governo – no sentido de passar a haver dois vice-PGR. Segundo essa sugestão, Pinto Monteiro apresentaria agora outro nome e, após a alteração da lei, reapresentaria Gomes Dias. Todas as possíveis alternativas foram recusadas pelo PGR. O chumbo de Gomes Dias, há duas semanas, foi inédito.
A reunião de ontem decorreu num ambiente de grande crispação e faz antever uma co-habitação difícil no futuro, uma vez que a composição do actual Conselho estará em funções até 2008".
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ADENDA

(...)" ambiente era de crispação, alimentada também pela ameaça feita na primeira reunião por Pinto Monteiro, que assegurou que moveria processos disciplinares a quem revelasse o que se passara na sala."

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Post Scriptum: kamikaze não é um blogger anónimo - quem quiser saber o nome/email é só ir ao profile, na side bar, e clicar no nick.

11 comentários:

o sibilo da serpente disse...

Discordo. Quem quis, pôde e mandou foi o SMMP... Explico de "forma anónima", onde remeto para aqui.

Kamikaze (L.P.) disse...

Subscrevo:

"A lei ainda é geral e abstracta?

Duas afirmações atribuídas ao PGR deixam-me abismado. A primeira é a de que, caso o CSMP não aceitasse o nome que iria (re)propor para Vice-PGR, a lei seria alterada (já lhe garantira o Governo!). A segunda é a de que cada voto contra o "seu" candidato seria um voto contra ele próprio.
Comecemos pela primeira. Eu estudei na Faculdade que a lei é geral e abstracta. Penso que todos estudaram o mesmo. Fico espantado por se "ameaçar" alterar a lei para "resolver" um caso concreto. Mal vai o direito se as coisas passarem a ser assim. Será que doravante sempre que o CSMP votar contra ou não afinar exactamente na melodia do PGR, este ameaçará alterar a lei?
Mas a segunda afirmação será talvez mais preocupante. Faz-me lembrar a "estratégia" bushesca do "quem não é por nós é contra nós".
Por último, devo dizer que considero, à semelhança de 3 conselheiros, que aqui saúdo, ilegal a (re)proposta do nome anteriormente chumbado. O que o Estatuto do MP diz (art. 125º, nº 2, por remissão do art. 129º, nº 2) é que o CSMP não pode vetar mais do que dois nomes. "Dois nomes" só pode ser dois nomes diferentes! Será que, com o mesmo nome, afinal o agora proposto é uma pessoa diferente? Ou será que, pela mão do CSMP, já começou na prática a revisão do EMP?
(Quero acrescentar que a eleição do Vice-PGR nem sempre foi pacífica, como agora se quer fazer passar. Marques Vidal - em 1981 ou 1982, não posso precisar neste momento - foi eleito à justa e após uma renhida discussão. É favor não falsifficar a história.)"

Eduardo Maia Costa, no Sine Die

Kamikaze (L.P.) disse...

Amanita: "DIZ QUE DIZ" ?
no DN (excertos):

"O procurador-geral da República (PGR), Pinto Monteiro, dramatizou ontem a escolha de Mário Gomes Dias para seu vice depois de este ter sido chumbado numa primeira reunião do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP). "Um veto neste nome é um veto na minha pessoa. E daí extrairei as devidas consequências", afirmou."
"Só que o aviso inicial do PGR quanto às consequências de um veto ao nome não caiu bem junto de alguns conselheiros. Pinto Nogueira, procurador distrital do Porto, chegou a afirmar que em 36 anos de carreira no Ministério Público nunca se sentiu "tão pressionado e intimidado". "
"Elementos do CSMP contactados pelo DN referiram que o facto de Pinto Monteiro ter encostado o Conselho à parede pode ter sido "confrangedor" para alguns membros. "Caso o nome fosse rejeitado, o ónus de uma eventual demissão do PGR recaía sobre o Conselho. Isso não era bom", declarou ao DN um membro do CSMP.
Elementos do CSMP contactados pelo DN referiram que o facto de Pinto Monteiro ter encostado o Conselho à parede pode ter sido "confrangedor" para alguns membros. "Caso o nome fosse rejeitado, o ónus de uma eventual demissão do PGR recaía sobre o Conselho. Isso não era bom", declarou ao DN um membro do CSMP."
"Ainda assim, as mesmas fontes contactadas pelo DN realçaram o "comportamento diferente" de Pinto Monteiro face à anterior reunião. Mais "diplomático", disseram"

Mais diplomático? Deve ter sido um mimo a 1ª reunião!

Kamikaze (L.P.) disse...

Diria mesmo mais: um grande mimo!

"(...)" ambiente era de crispação, alimentada também pela ameaça feita na primeira reunião por Pinto Monteiro, que assegurou que moveria processos disciplinares a quem revelasse o que se passara na sala."

in Público on line

o sibilo da serpente disse...

Acima, onde escrevo SMMP, quero dizer CSMP

Gomez disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Gomez disse...

Cara Kamikaze:

Antes de, pela minha parte, pôr - em definitivo - uma higiénica pedra sobre o assunto, deixo aqui reproduzido um comentário que, a instâncias do CR coloquei no Anónimo :


“Sobre a “solução” que vingou, já disse o que achava e não mudei de opinião.

O que se passou foi, a meu ver, uma manifesta ilegalidade (independentemente do que se pense sobre os méritos do nomeado).

Afinal, face ao EMP em vigor, numa deliberação sobre a adequação do perfil do indigitado ao cargo a prover (Vice-PGR), o que significa um “veto”?

Nem se tente tapar o sol com a peneira, falando de uma “reapreciação” à luz de alegados “dados novos” (o cargo não é o mesmo?, as competências idem?, o CV / perfil do indigitado não é o mesmo? alterou-se alguma circunstância de relevo?...). Trata-se de um malabarismo, que não espantaria num discurso político, mas que parece impróprio de uma magistratura.

Espero, sinceramente, que a prática futura do PGR e do Vice-PGR permita que este episódio caia no esquecimento. Há cada vez menos pilares, neste putativo Estado de Direito, em que o cidadão possa (ainda) confiar.

Noutro plano - como também já disse - estou convencido de que o PGR cometeu um erro de estratégia, que adensará as resistências internas e lhe dificultará a sua missão. A sua opção, cada vez mais clara, por um estilo de liderança autoritário também não é feliz. Esse estilo não costuma dar bons (ou duradouros) resultados em organizações complexas, ou em processos de reorganização complexos, sendo certo que aqui se confrontará com dificuldades acrescidas decorrentes do estatuto (constitucional) dos magistrados do MP.”.
Disse.

(rectificação do comentário anterior que tinha erros de HTML)

victor rosa de freitas disse...

A PROPÓSITO DA NOMEAÇÃO DO VICE-PGR

No dia 17 de Outubro de 2006, o Sr. PGR, Conselheiro Pinto Monteiro, propôs ao Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) a nomeação do Dr. Gomes Dias, como Vice-PGR.

O CSMP vetou este nome, o que está dentro das suas legais competências.

Na reunião do CSMP de 3 de Novembro, o Sr. PGR voltou a indicar o mesmo nome, pedindo que aquele Conselho reapreciasse a sua anterior posição, o que foi aceite, passando a apreciar os novos dados apresentados pelo Sr. PGR, tendo tal nome, agora, passado por maioria de votos.

É este procedimento administrativo legal?

Parece-nos bem que sim.

Com efeito, dispõem os arts. 138º e 140º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) que os actos administrativos são livremente revogáveis, por iniciativa dos órgãos competentes ou a pedido dos interessados, excepto nos casos que a Lei prevê, excepções essas que se não verificam aqui.

Após o primeiro chumbo, pelo CSMP, ao nome indicado pelo Sr. PGR, nada obstava (nem obsta), na Lei, que este pudesse pedir a reapreciação de tal acto administrativo com vista à sua revogação, que foi o que aconteceu.

Tudo, pois, perfeitamente legal.

M.C.R. disse...

Querida Kamikaze
O meu velho, querido e desaparecido amigo, José Luis Nunes confidenciou-me uma vez que o que mais gostaria de fazer era ser treinador político.
Ou seja: ensinar as pessoas organizadas numa qualquer organização a pensarem politicamente e a agirem em consequência. Convenhamos que era um programa de trabalhos enorme.
Sem querer imitar o JLN eu penso que a rapaziada votante do CSMP bem que precisaria de um treinador político. Aliás, V. que faz o favor de aturar e ler o que aqui escrevo sabe que ando a insistir nesta tecla há muito.
Os três cavalheiros (não os conheço mas presumo que sejam cavalheiros) que se abstiveram por acharem ilegal a 2º votação deveriam antes ter votado sob protesto por acharem o acto ilegal. Teríamos assim um belo empate, se é que os números não enganam.
Os referidos cavalheiros farão o favor de me desculpar: entregaram o caso de mão beijada!
Não terá sido por mal, concedo, mas lá entregar, entregaram. Terei todo o prazer em fornecer-lhes o meu nome completo se entenderem dever tirar satisfações: Marcelo Correia Ribeiro.
Note-se que não me pronuncio sobre a parte essencial da questão, ou seja, se o cargo deve ser votado ou apenas comunicado. Isto, claro, sem fazer caso da lei, que no caso em apreço parece ter sido feita para mais cedo ou mais tarde haver um resultado deste teor. Pelo andar da carruagem será brevemente revogada. E pelo ar do andar da carruagem, dentro em pouco, a lei organica do MP poderá ser bem pior. Preparem-se e não digam que eu sou de mau agoiro. Eu sou só um mensageiro... Ou nem isso: um modesto adivinho

Carlos Rodrigues Lima disse...

Kamikaze,

O que é uma side bar???

Gomez disse...

O respeito que me merece o comentário 9, supra, obriga-me a levantar um pouco a higiénica pedra que tinha colocado sobre o assunto.

Sem me querer alongar a outros aspectos que poderiam ser chamados à colação, realçaria apenas que, de acordo com a interpretação que defendi (e continuo a defender) a letra e, principalmente, a “ratio” do regime legal previsto para este específico procedimento de nomeação, excluem claramente a possibilidade de reapresentação de um nome “vetado”. Uma tal possibilidade, no âmbito do mesmo processo, propiciaria até impasses (se o PGR entendesse insistir repetidamente no nome em vez de propôr outros) que o legislador manifestamente quis evitar. Deveremos assim concluir, s.m.o., que às deliberações de “veto” tomadas no âmbito deste procedimento especial não poderia ser aplicado o princípio geral da livre revogação / alteração dos actos, por se verificar uma das excepções consagradas (a lei em causa o não permitir).

Convirá também ter presente que, quando permitida, a eventual opção pela revogação / alteração não é tomada arbitrariamente e está sujeita ao dever geral de fundamentação.

Possivelmente por a questão não ser tão linear como se admite no comentário 9 e por estar ciente destas (e/ou outras) objecções, o PGR (a fazer fé na nota de imprensa divulgada) teve o cuidado de solicitar a reapreciação da deliberação, invocando, expressamente, a existência de alegados “novos dados”. Julgo, porém, que qualquer observador desapaixonado concluirá que (parafraseando novamente os “Rádio Macau”) “não há nada de novo aqui, debaixo de sol” ... – pelo que tal argumento, como anteriormente referi, não colhe.

Creio que não valerá a pena continuar a dissecar este tema. Pela minha parte não o farei. Só espero que a actuação futura do PGR seja de molde a fazer esquecer este episódio que, no mínimo, se terá revestido de contornos de duvidosa legalidade e de desnecessária crispação...