04 dezembro 2006

Au Bonheur des Dames 40

Variações sobre um conselho de leitores amáveis
Volta e meia aparece-me um leitor ou o seu substituto etéreo (um e-mail) que me desafia para aventuras impossíveis, que pergunta se estas historietas são mesmo verdadeiras, para já não falar em dois exigentes que me chamam de tudo porque não produzo o suficiente número de postais. A acreditar neles (um ele e uma ela) eu sou um preguiçoso (o que por acaso é verdade), que até por dar ao dedo redactorial se cansa. Então a leitora é dramática: adoça-me o ego (bastante escalavrado é verdade pelos anos e pelas desilusões) com umas loas à minha escrita “fácil como quem conversa enterrado num sofá” (boa imagem leitora, boa imagem!) e logo a seguir uma estocada fatal, à Lagardére (se é que algum dos que me aturam alguma vez leu as aventuras de Lagardére, desse cavalheiro de bem chamado Paul Féval, que, com Ponson du Terrail, alimentou muito rapazinho leitor na nunca suficientemente exaltada Biblioteca Municipal Fernandes Tomás, Figueira da Foz): escrevo pouco (!!!) sou um preguiçoso (e ela a dar-lhe...), um valdevinos, nem para um blog decente sirvo. Não é bem assim mas o tom geral é mais ou menos este. O cavalheiro leitor é (uma vez sem exemplo!) mais sofisticado. Não me acusa de nenhum pecado mortal (e ainda bem porque agora não temos aqui à mão o frei Delfim das Cinco Chagas para rezar por nós) mas num movimento envolvente acaba por me cominar aos mesmos trabalhos forçados: tens de escrever, pá. Agora que o Carteiro foi dar uma volta ao bilhar grande, tens de escrever por ti e por ele. Que diabo isso também não é nenhum sacrifício, pá. E depois a coisa sai-te assim tão do pé para a mão, vá lá não te armes... E por aí fora.
Pela amostra já os restantes leitores (se é que há mais algum/a) podem calcular como me sinto emba(ra)çado. Eu ia mesmo escrever embaçado, mas lembrei-me a tempo de uma senhora de uma editora que não gostava de plebeísmos. Se alguém, por exemplo, dissesse que X abalou em vez de dizer que X foi embora, ela, do alto da sua proteica ignorância do português bom e antigo como o pão que se amassa à mão e que se corta ao cimo com uma cruz (S Marcos te amarque, S. Mancos te amanse), disparava logo que abalar só no Alentejo é que se usava para significar partir, ir de viagem. E, zás! Um risco raivoso na folhinha conspurcada pela alentajanada. Já me perdi!, raios! Onde é que eu ia? Ah, já sei: na palavra embaçado. Embaçado por via de um leitor embuçado que me critica como quem puxa as orelhas ao menino que não fez os deveres de casa que o senhor professor marcou.
Ora vamos lá a ver se nos entendemos. Por muito que isso prejudique a imagem que de mim alguma leitora mais benévola possa ter, eu esfalfo-me ou esfalfo as pobres e cansadas meninges para produzir os posts que com alguma regularidade aqui ponho. À uma porque tenho algum amor próprio e recuso-me a vender material de segunda mão, ou cópias produzidas na china. Aqui o produto é inteiramente artesanal, novo, e ecológico. Tirante o MacBook Pro o resto é tudo manual. Depois mesmo quando parece que escrevo de carreirinha terão de convir que tive de pensar um pouco no que vou levar para a feira. Finalmente, a escrita, como tudo o resto, aliás, obedece a regras gramaticais, sintácticas e o mais que se lembram (eu escrevi isto com o pobre coração nas mãos: é que li por aí que agora anda à solta uma tal TLEBS que esfola quem falar em substantivo e atropela quem num último estertor murmurar “complemento circunstancial de modo”. A dita cuja TLEBS da senhora professora doutora Mira Mateus e das suas dez mil virgens martirizadas pela tarefa tremenda de rebentarem com o crânio das novíssimas gerações com a tal terminologia moderníssima e inteligentíssima é no dizer de oito ou nove indivíduos de maus fígados e piores bofes uma coisa horrenda. Claro que esta gentuça que critica o progresso imenso da senhora Mira Mateus é tudo um bando de comunistas, de pedreiros livres, de goliardos que só sabem dizer mal de quem trabalha. Polícia neles doutora Mateus. Polícia e chanfalhada forte. Ou então esse novo produto do Litvinenko, o polónio número x, o que mata sem dor e rapidinho. É dar-lhes que são mouros, muçulmanos, anarquistas e mariolas.) Lá me perdi outra vez, mas os leitores desculparão: agora foi um desvio patriótico em defesa dos cinco mil professores (cinco mil? – Arrium porrium catanorum cunque! E nós temos cinco mil inteligências só no professorado da doutora Mira Mateus? Ah país duma cana! Ainda vamos a tempo de descobrir as Berlengas! A nau, à nau que temos gentil maré!)
Bom, expurgados que estão os infiéis, os renegados os inimigos do progresso linguístico, voltemos à vaca fria. Ou seja à escrita deste escriba. Alguma vez terei dito que anda por aí muito cidadão cujo sonho era viver deitado à sombra de uma bananeira de onde as bananas já descascadas e em bocadinhos lhe cairiam directas na boca mimosa. Ora, fora a ilha da Madeira onde isto quase acontece (e por isso a Madeira é a região mais rica de Portugal. Ai não sabiam? Pois consultem o jornal, leiam-no com olhos de ler, porra, e logo verão. Contas feitas o reino do Jardim é um Éden. O facto, aliás trivial, de ser o pagode continental a pagar os luxos de pouco importa: andámos a colonizar a Madeira, a chamar-lhes ilhéus, comedores de bananas e tudo o mais? Pois agora estamos a pagar tão feio pecado. Deve ser por isso que a TLEBS nos caiu em cima. A TLEBS, a Ministra da Educação e o IRS! Pecámos muito mais do que nos era permitido e agora Deus castiga-nos com a oitava praga do Egipto. É bem feito!) a realidade é bem outra. Este, que por aqui vai esgaravatando, sua as estopinhas para produzir meia folha de prosa. Ou quando isso não sucede, o resultado é o que estão a ver, agora mesmo: querendo defender-me das acusações dos leitores, acabei por falar na TLEBS (logo eu que sou um ignorante, senhora doutora professora Mateus, mira hijo que barbaridad un bribón con canas, Dios mio! ) no Alberto João, um pai da pátria que o pariu, na Senhora Ministra que Deus tenha em seu regaço, e em mais um ror de coisas de que só poderei lembrar-me se andar para trás (ou para cima) no computador. Como não estou para isso paro aqui mesmo, assino e despeço-me prometendo não reincidir.

6 comentários:

Sónia Sousa Pereira disse...

llllllloooooolllllll

Reincida senhor, reincida!

Por quem sois?

S.

o sibilo da serpente disse...

Continua em grande forma, MCR! É o que vale ao INC, que mais parece um blog individual.
Um abraço cr

O meu olhar disse...

Sempre brilhante caro MCR!
Caro Carteiro, obrigada pelas suas palavras mais abaixo, no post que coloquei. Também tinha saudades de andar por aqui de uma forma mais assídua.
Um abraço a ambos.

josé disse...

Aos poucos, vamos lendo o aparecimento de um estilo. Inimitável.
O incentivo com aguilhão,
é só por isso. E vale a pena.

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Ainda não foi devidamente homenageado o grande líder Pedro Santana Lopes e sua ministra Maria do Carmo Seabra por esta magnífica TLEBS que legaram aos (desgraçados)vindouros!

M.C.R. disse...

JCP, querido Amigo

homenageemos também o sr. eng. Sócrates e a sua inefável ministra de cujo nome não me lembro (o que também não é grave, a criatura é o que é... e é-o com força!) que mantiveram a TLEBS merdosíssima! Les beaux esprits se rencontrent mon Cher!