07 abril 2007

Adenda



O meu texto sobre o Adriano mereceu um comentário que agradeço mas que me obriga a responder aqui e não em segundo comentário. Aliás por uma deficiencia do brouser que não me reconhece a password também não conseguiria responder ao comentário.
O comentador Raimundo Narciso deixou uma breve nota em comentário para a qual remeto porque não a quero resumir aqui por temer que me falhe algo de essencial.
Todavia, e porque não consigo juntar-lhe esta resposta aqui a deixo. Aliás penso que esta resposta é demasiadamente importante (para mim) para a deixar perdida num texto a que eventualmente já ninguém irá.
Ei-la:

Se V. é o NR que eu penso, desculpará que lhe diga que, na altura, a amargura do Adriano tinha muito a ver com os militantes (certos militantes e certos responsáveis infelizmente com decisiva influencia) e com a organização política em que ele generosamente (como muito bem reconhece) militou e a que nunca deveu nada, antes pelo contrário. Não era o PCP que fazia a fama de Adriano, foi Adriano que deu muito ao partido, a começar pelas inúmeras borlas em concertos nos tempos da clandestinidade, pela voz que emprestou às canções de luta, pelo exemplo que forneceu de artista empenhado e militante. E por aí fora.
Desculpará mas 1988 é uma data que já nada diz a quem morreu antes. O terrível foi ele não ter podido desabafar com camaradas mas tão só com amigos, de esquerda é certo, como eu, mas que obviamente não o tinham acompanhado no empenhamento militante dentro do pcp. E que por vezes (e muito bem, permita-me) combateram as teses do pcp sem por isso deixar igualmente de combater o regime salazarista.
Não veja nisto nenhum ajuste de contas com um passado que, hoje em dia, é quase comum mas tão só uma amarga advertência para o futuro. Os unanimismos e outros ismos igualmente maléficos geram muita e trágica amargura.

Na gravura: sob uma efígie de Marx a legenda: é possível um mundo diferente.
Às vezes não é, ou não foi. Vamos lá a ver se aprendemos com os erros, as omissões, os esquecimentos, a proeminencia da táctica sobre a nossa profunda convicção. Etc.

1 comentário:

Kamikaze (L.P.) disse...

Email/comentário recebido na caixa de correio do Incursões:

«Caro M.C.R.,

Permita-me um reparo: acho que foi injustamente agreste com o Raimundo Narciso. Li o comentário deste ao seu post (magnífico, como é habitual, e a que me dei ao atrevimento de citar no meu blogue) sobre Adriano e a frase “Lembro-me de uma última conversa (81? 82?) em que ele estava muito amargurado. Mas não iria desabafar comigo como se eu já estivesse em 1988” não é mais nem menos que uma autocrítica pública. E, neste sentido, um acto de humildade (tipo auto-punitiva). O que RN reconheceu foi que, numa altura em que fazia parte do CC do PCP, mesmo que disponível para ouvir camaradas ou amigos com dúvidas ou angústias, não é a “estrutura” (alinhada ou que se considera alinhada) que os “angustiados” procuram porque, à partida, há uma barreira psicológica (e política) de inibição mútua. Como da parte da “estrutura”, as energias estão sempre mais concentradas a mobilizar os crentes entusiastas. É uma questão clássica nos processos de “dissidência” ou “descrença”. O “tempo de amargura” de RN chegou mais tarde (e com uma violência que levou à sua expulsão do PCP, violência esta que não atingiu Adriano e permite que, agora, o “Avante” o cante como um seu militante ortodoxo e até exemplar, um verdadeiro património do PCP, enquanto RN é tratado como um vendido à direita e ao grande capital). E ele, RN, no seu comentário, lamentou o desacerto de datas que obviaram ter gerado, no momento útil, uma oportunidade de ajuda amiga ao Adriano no momento em que este a necessitava. E julgo que escolheu o seu post para fazê-lo por o saber, caro MCR, como não camarada mas amigo de Adriano, merecedor portanto de ser abrigo para o desabafo. Vc tem a felicidade de sempre ter tido a perspicácia política de nunca ter pertencido ao PCP, sem que isso o tenha inibido de combater o fascismo. Felicito-o por essa clarividência e pelo talento na gestão de uma honrosa independência. Mas esse justo orgulho não justifica que seja demasiado severo com os que “lá andaram”, negando o direito ao ”erro”. E desse “mal”, nem o genial Adriano esteve isento. Muito pelo contrário.


Abraço do

João Tunes


PS 1 - Obviamente que percebeu que não sou nem pretendo ser advogado de defesa do Raimundo Narciso. Apenas sou seu amigo.

PS 2 - Não consegui meter este texto como "comentário" e por isso recorri ao mail. Utilize-o como bem entender.»