20 setembro 2007

Tempos conturbados

Há épocas da vida em que sentimos que tudo corre mal. As nossas certezas vacilam! As nossas convicções deixam de parecer coerentes com a realidade que vivemos! E, no entanto, não conseguimos deixar de ser o que somos, de agir como consideramos correcto, esperando que a turbulência passe. E há-de passar ...

Há dias, faltei a uma almoçarada porque tinha julgamento num daqueles processos que já nos custa ver, tal o tempo decorrido, tais as vicissitudes porque passou. Mas dever é para cumprir. Só que, na hora designada, com o Juiz na sala, verifica-se que a Colega não apareceu, nem disse nada. Faltavam também as testemunhas que ela havia arrolado. Mandei SMS. Recebi resposta que estava noutro tribunal. O Senhor Juiz, nos termos da lei, dado não ter recebido qualquer comunicação da mandatária, queria iniciar o julgamento. Senti-me desconfortável e solicitei o adiamento, que me foi deferido com o elogio pelo comportamento deontológico. Não percebi sequer o elogio, pois pensava que todos assim procediam. Mas, segundo me foi dito, parece que a prática já não é esta! Triste profissão a minha!

Sábado passado, durante hora e meia, estive a falar a dirigentes dos Escuteiros sobre a responsabilidade civil e criminal. A incredulidade dos ouvintes foi patente. De facto, não se admite que pessoas que dão a sua vida, esforçada e gratuitamente, ao serviço dos outros possam ser responsabilizadas pessoalmente, nos termos em que os tribunais vêm interpretando a causalidade adequada em caso de acidente, onde se inventam mil e uma acções exigíveis para evitar o dano. Não há protecção para quem trabalha em favor dos outros. Nenhuma seguradora aceita cobertura adequada, muito menos para quem trabalha com menores de 14 anos. O Estado devia promover um Seguro Social do Voluntário que lhe permitisse trabalhar com um mínimo de protecção contra os riscos inerentes à acção educativa. É claro que a sociedade privilegia o ócio e a estupidez das novas gerações, em nome de uma falsa noção de proteccionismo, que muitas vezes roça a paranóia do risco. A vida comporta riscos e as crianças e jovens precisam de aprender a enfrentá-los, promovendo a solidariedade, a partilha, a participação, o empenho pessoal e comunitário, o desenvolvimento integrado e equilibrado da habilidade manual, da criatividade, da inteligência, da vontade e do sentido de dever e da responsabilidade.Mas nesta sociedade mesquinha, obtusa, confusa e emocional, os verdadeiros problemas não se colocam, não se discutem, não se resolvem.

O sistema legal português é disfuncional e constitui na actualidade um elemento de grave perturbação da organização e coesão social. Por isso, ninguém entende as leis que saem (a não ser os altos especialistas que as elaboram), nem os critérios de aplicação, nem as decisões judiciais. Quando assim acontece, a culpa de certeza que não é do Povo! Ou será?!

Para a semana, devo estar mais bem disposto, espero eu ...

2 comentários:

M.C.R. disse...

E N´OS A PENSARMOS QUE V ANDAVA DESAPARECIDO...
UM ABRAÇO

O meu olhar disse...

Grande texto amigo Mocho Atento, grande texto e grande reflexão. Pena é que seja tão representativo da realidade que nos cerca.
Um abraço