24 novembro 2007

Diário Político 68


O Dr Meneses, nova estrela d’alva do sempre renascente PSD (renascente e surpreendente, diga-se já) desistiu de reduzir o número de deputados para em troca conseguir um acordo com o PS quanto a mais alguns pormenores das futuras leis eleitorais.
É provável que na cabecinha pensadora do Dr Meneses este golpe de rins tenha parecido um exercício deslumbrante de inteligência política. E também não será descabido supor que o líder do PSD ache que o povo se renderá incondicionalmente a este robusto raciocínio político.
Eu não tenho nada a ver com o PSD e muito pouco com o actual PS. Digamos que votei neste último por mero descargo de consciência e porque o iluminado Dr Santana ameaçava reduzir o pais a uma espécie pouco interessante de capoeira de galinhas pedrês. Um sobressalto patriótico venceu o nulo entusiasmo que o presumível engenheiro Sócrates me despertava. Entre dois males, o menor.
Dito isto, que podem tomar como declaração de interesses, convém esclarecer que o golpe de rins do Dr Meneses me parece excessivo e totalmente ineficaz. À uma desiste da redução da deputadagem coisa que no país ilustrado (e também no outro, aliás) despertava alguma simpatia. A ideia geral é que cortando a eito naquele areópago cacafónico talvez se conseguisse, por eliminação dos mais incapazes, uma pequena melhoria do pessoal político. Isto se, com um número menor de eleitos, os partidos abdicassem daquelas múmias paralíticas que mais não fazem durante os quatro anos de mandato do que levantar e sentar as partes pudendas. O que não está provado. A meia dúzia de palradores de serviço prefere ter uns yes-men e umas yes-women nas filas de trás do que alguém capaz de pensar pela própria cabecinha. Mas enfim, sempre era uma tentativa. E ficava mais barato aos cofres públicos.
Abandonando isto, o Dr Meneses rende-se mesmo antes de começar a refrega. Por mim tudo bem, não tenho nada a perder com uma nova e cada vez mais previsível derrota do PSD nas próximas legislativas.
Mas há por trás deste anúncio uma suspeita. Será que o Dr Meneses não foi obrigado pela clientela deputante a largar este osso? Ou seja, uma redução dos lugarzinhos em S Bento prejudica todos e sobretudo os dois partidos rotativos que, qual Dupont e Dupond, se tem sucedido na (des)governação da pátria mal amada. Funil mais estreito, menos oportunidades. Aliás, numa ocasião, tive oportunidade de ouvir em confidência duas sumidades políticas de médio alcance. Ambas consideravam horrível esta ideia de cortar nos lugares à mesa do orçamento. Mas o parlamento nem sequer paga assim tanto, argumentava eu. Mas paga, responderam-me. E a tempo e horas e não só não é grande canseira mas ainda abre hipóteses para umas assessorias camarárias, uns lugarzitos mimosos em empresas mais ou menos públicas, enfim, a coisa dá. Dá prestígio (!!!), dá cacau, dá reforma boa e rápida e dá entrada noutros negócios. Fiquei assim ciente desta nova corrente ideológica a que por simpatia chamarei nacional-dadivosismo, prevenindo desde já que quem a usar sem licença pagará direitos.
Objectar-me-ão que na Assembleia se usam indiscriminadamente duas expressões: surrealismo e tremendismo sem que os seus usuários sejam chamados à pedra. Sempre respondo que no primeiro caso faz parte da prática surrealista deixar qualquer energúmeno usar o termo surrealismo sobretudo fora de tom. E no segundo, informo que embora Camilo José Cela tenha usado o tremendismo com outra conotação, nada pode fazer porque está morto e enterrado. Como o tremendismo, aliás. Mas isso são outras contas.
Sobra-nos então esta novidade política que deve fazer rir a bandeiras despregadas os deputados receosos e a direcção do PS. Convenhamos que uma oposição assim permite tudo ao actual Primeiro Ministro. A menos que com tanta cedência ele acabe por ganhar demasiada confiança nas suas possibilidades e se estatele um dia destes. A ser assim, o Dr Meneses ainda conseguirá ficar na história. Como aquela poltrona do finado Dr Salazar.

d'Oliveira fecit

1 comentário:

JSC disse...

Nunca acreditei na redução do número de deputados. O papel dos políticos é criar novos lugares ou cargos políticos e não eliminar postos de trabalho para a classe. Por exemplo, na última meia dúzia de anos foi criado um sem número de empresas públicas, empresas municipais, institutos públicos e entidades afins para que muitos dos chamados gestores por nomeação política pudessem desenvolver a acção política (no partido) a expensas do serviço público. Ora, se reduzirem o número de cargos políticos, seja no parlamento, no governo ou nas autarquias, lá irão aparecer mais empresas públicas, municipais ou outras entidades para empregarem os excedentários.
Por estas razões parece que ficará mais barato mantê-los no Parlamento, poupa-se em despesas de instalação.