13 dezembro 2007

O leitor (im)penitente 27


F(ra)nac(a)mente!

Abre hoje uma grande livraria em Lisboa e promete-se uma igual para o Porto. Boas notícias para um leitor empedernido e vicioso como já não se fabrica. Desejo à nova loja muitos leitores como eu, passe a imodéstia. Garanto que não vão à falência...
Até lá, e noticiando a abertura de uma Leitura 2 (ou leitura books and living, para que é que serve o ingliche?) bom espaço, assim se encha de bons e raros livros, comentemos esse armazém de coisas que dá por FNAC.
Comecemos pelo princípio como dizia um imortal professor da Faculdade de Direito de Coimbra: a FNAC portuguesa tem muito pouco a ver com a congénere francesa que aliás tem piorado a olhos vistos. Cá é ainda mais pequena, menos livros, muito menos discos mas prosápia a fartar.
A receita é continuar a frequentar as boas livrarias antigas e ir à FNAC em último recurso. Inclusivamente no capítulo livro estrangeiro estamos conversados: ninharias, sucessos e pouco mais.
Na cidade dos tiros à noite convém manter o saudável hábito de frequentar as três L: Latina, Leitura e Lello (em rigorosa ordem alfabética para não protestarem). Quem aqui não pescar a pérola preciosa, não a pescará em mais nenhum sítio. Estas três livrarias, fruto de muita paixão, do trabalho honrado de grandes livreiros ( O senhor Perdigão e agora o filho, o velho Domingos Lima e esse príncipe renascentista que dá por Fernando Fernandes). E de bons e fieis clientes, digo eu, puxando a brasa à minha sardinha. Que um cliente pode ser um ajudante de primeira ordem. Pelos livros que compra, claro. Pelos que encomenda depois, pelos que descobre sabe-se lá em que secretos escaninhos da imprensa livreira e editorial internacional.
Deixem-me contar duas cenas dos últimos quinze dias para explicar a diferença entre comprar numa livraria ou comprar num supermercado de livros.
Uma senhora historiadora publicou há já alguns anos um curioso e interessante livro sobre Sidónio Pais (“Verdes e Vermelhos, ed. Notícias, 2002). Fui por ele, convicto que um livro de história do século XX ainda andaria pelas prateleiras. Nada! Num momento mal inspirado encomendei-o na FNAC. Quinze dias depois comunicaram-me gentilmente que o livrinho estava esgotado. Um leitor obsessivo e frustrado é, todavia, um leitor perigoso. E teimoso. Passei pela Latina e, fazendo-me parvo, perguntei pelo livro. Dez minutos depois, garantiam-me que o livro ainda estava em circulação. Ao fim de meia hora os livreiros tinham contactado a editora e tinham-se certificado que o livro existia em armazém e que podia ser enviado. Já cá canta! Assim, de fácil, de risonho. Sem cartão de cliente sem nada. Apenas um bom serviço.
A segunda história roça o pornográfico. Uma namorada do meu sobrinho ao saber que eu fazia anos resolveu oferecer-me um livrinho do Grouxo Marx. Claro que eu já o tinha mas dado que vinha da FNAC e ainda trazia a etiqueta (sem o preço) fui trocá-lo.
Trocaram-mo, há que dizê-lo. Mas... descontaram-me 10% do preço fnac. E descontaram porque nos dias 28 e 29 de Novembro houvera umas jornadas do aderente com desconto geral de 10%. Vai daí entenderam que um livro a trocar a 12 de Dezembro poderia ter sido comprado nessas jornadas. Por acaso faço anos a 26! Ou seja, pareceria impossível que a prenda fosse comprada dois ou três dias depois. Ainda estive para fazer voz grossa, chamar um dos inumeráveis responsáveis daquela “cour des miracles” mas depois achei que não valia a pena. Que se lixe a Taça que é de pau! E fui arejar até à Leitura com passagem pela Lello. Respirar um ar menos malsão.
Depois disto, e voltando ao princípio: que seja bemvinda a novel “Biblos”, sobretudo se vier para ser uma Livraria, isto é um lugar de encontro entre leitores, autores e mediadores, parco nome para livreiros.

Vai esta em memória da Livraria A Erva Daninha, aventura de um grupo de amigos que gostavam de livros e de os ler. E do Arnaldo Fleming motor dessa pequena loucura.

A gavura: bela edição do grande Rabelais, autor de cabeceira em francês antigo e tudo.

4 comentários:

jcp (José Carlos Pereira) disse...

Das livrarias dos três L fui sempre mais da Leitura. Um dos meus poisos preferidos durante os anos de universidade.

JSC disse...

Às livrarias indicadas, sendo notável a renovação da Latina, deve juntar-se a UNICEPE, que é também um exemplo de resistência e dinamismo. Para o confirmar veja http://www.unicepe.com/jantares.html

M.C.R. disse...

sem dúvida, caro JSC, mas eu pensava que a Unicepe já estava fechada. claro que a Unicepe merece uma saudação. Mesmo sendo de outro campeonato, do campeonato da Livrelco em Lisboa e da Unitas em Coimbra, ou seja das livrarias saídas do movimento cooperativo estudantil, dos anos 60.

K. disse...

Eu sempre fui mais da Lello. A FNAC é, efectivamente, uma miséria. Mas até no panorama da literatura nacional. Desde há meses largos que os livros do Gonçalo M. Tavares se vêm em destaque em qualquer livraria de qualidade em Barcelona (e ainda são algumas!). Além de estarem em destaque, tinham vários exemplares de todos os seus livros, às vezes em castelhano, catalão, português. Na FNAC do Norteshopping ontem de manhã tinham apenas dois (2) exemplares do "Jerusalém" e do "Aprender a Rezar na Era da Técnica"...