... Fomos testemunhas duma época
Em que daqui a cem anos ninguém acreditará
Nessa altura será compreendida a revolução nosso túmulo
E os que manipulavam o rádio
Vitezlav Nezval
(em memória de V. I. Lenin, “Pantomina”, 1924 – recolhido em Prague aux doigts de pluie, Éditeurs Francais Reunis, Paris, 1960)
Os leitores perdoarão a pequena ironia da citação que abre este texto sobre 1968 nos países do “outro lado”.
Convenhamos que, agora, é difícil compreender o panorama político e social da Polónia, da Checoslováquia e da Jugoslávia nesse longínquo ano de 68. Aliás juntar três realidades tão diferentes é um risco que se assume mas que se espera justificar. Pretende-se apenas mostrar como é que um regime mais ou menos idêntico em três países responde a reclamações que de início eram extremamente moderadas e não o punham em causa.
Comecemos pelo caso polaco.
Tudo começou pela proibição da peça “Os antepassados” de Mickiewicz, autor do século XIX, cuja peça é um manifesto contra a política czarista, numa época em que a Polónia estava ocupada pela Rússia.
A época não estava para zurzir no grande irmão mesmo que os odiados czares já só fossem passado. E não estava porque, no caso em apreço, a Polónia era governada por Gomulka, um comunista discretamente anti-russo mas suficientemente cauteloso para não permitir que no seu país se instalasse uma desordem idêntica á que grassava na vizinha Checoslováquia.
Depois, assistia-se, nos circuitos internos da inteligentsia polaca a uma ofensiva “anti-burocrática” de que a “Carta ao Partido Operário Unificado Polaco” de Kuron e Modzelewski era o mais recente exemplo.
Em termos muito gerais, a batalha que se travava nas universidades polacas tinha muito a ver com a liberdade de expressão que, estranhamente tinha feito uma breve aparição na Polónia na sequência da contestação de Bierut e na ascenção de Gomulka. Jornais tinham aparecido (por todos Po Prostu) grupos de discussão e os famosos “Conselhos Operários”. Todavia, logo que a nova situação se estabilizou, as coisas voltaram ao ritmo anterior. Po Prostu foi silenciado, os conselhos foram descritos como um desvio anarquizante e as centenas de militantes que se tinham revelado começaram a ir para a prisão.
A elaboração do manifesto de Kuron e Modzelewski, resultado iasás de múltiplas contribuições e reuniões, respondia a esse ataque ás liberdades um tempo reencontradas.
A peça de Mickiewicz, apareceu no momento errado e sobretudo a sua estreia ocorria durante o desenvolvimento do processo checo. Se se acrescentar que o ambiente económico era pouco entusiasmante, logo se percebe que estavam reunidas as condições para uma explosão universitária que para ter êxito precisaria de apoio nos meios sindicais e nas fábricas.
Algumas greves esporádicas terão entusiasmado os estudantes que ocuparam algumas universidades e saíram para a rua. Mas os operários ficaram quietos e o fogo que ameaçava consumir a nação polaca foi apagado como fogo de palha que ao fim e ao cabo foi. Em Maio o movimento estava extinto. Gomulka poderia continuar a governar reprimindo aqui, diminuindo a pressão acolá. Durou mais vinte anos.
Na Jugoslávia, país tecnicamente não enfeudado a Moscovo, com liberdades inimagináveis para os habitantes do bloco de leste (liberdade de emigrar, de viajar, de criar empresas privadas etc..., o movimento tem origem num facto sem qualquer importância: uma rixa entre estudantes e uma brigada empenhada numa “acção de trabalho”.
A milícia intervém e os estudantes apanham pela medida grande. No dia seguinte são milhares a desfilar desde a cidade universitária nos arrabaldes até ao centro de Belgrado. Nova intervenção da milícia e novos combates de rua.
A greve universitária é proclamada, as faculdades são ocupadas e o já clássico Maio repete-se aqui em Junho.
A imprensa apodera-se do assunto. Os estudantes barricados sobem o tom das suas criticas. Não é só a intervenção da milícia que é criticada mas também as insuficiências do ensino, a falta de saídas profissionais para os licenciados, a “burguesia vermelha” de Belgrado e a falta de solidariedade internacional com os Vietnam e a revolução mundial.
Do lado do poder as acusações também não faltam: partidários de Djilas, saudosos do antigo regime monárquico, trotskistas ou, inimigos da Federação!, isto é nacionalistas pequeno-burgueses.
Finalmente, quando se pensaria que a situação atingia o paroxismo e que se assistiria a uma repressão selvagem, Tito, chefe indiscutível, que forjara o seu poder na resistência aos invasores alemães e na oposição à União Soviética, intervém e salomonicamente declara encerrado o conflito: a maioria dos estudantes é sã e tem razão. A culpa dos acontecimentos é toda de uma ínfima franja de anarquistas, da falta de cuidado da polícia e da situação internacional.
A intervenção dos “irmãos de armas” comunistas na Checoslováquia e a brutalidade com que é feita perante um vago e comedido protesto ocidental, convencem estudantes contestatários e autoridades diversas a esquecer afrontas antigas e fingir que tudo vai pela melhor no melhor dos mundos. Não ia, como já Voltaire provara dois séculos antes.
E agora, a excepção: Excepção porque no caso checo não se trata de uma revolta juvenil com maior ou menor ressonância na população. Não está em causa a oposição aberta ao regime mas algo mais profundo mesmo que isso nos pareça ridículo. É de independência nacional que se fala. De facto a queda de Novotny e a relativamente longa experiência de gestão de Dubcec como dirigente comunista, não faziam prever á partida nada mais do que uma mudança de equipa forçada pelas circunstâncias.
Nunca saberemos como é que um comunista eslovaco, educado na URSS, ex-resistente e homem do aparelho chegou á conclusão que era preciso temperar o vinho velho do comunismo em uso no leste. Levar a destalinização um pouco mais longe. Bastante mais longe, se entendermos por isso pedir a intervenção das massas na condução dos negócios públicos. E permitir o escrutínio de toda a actividade do Partido pelo povo, a todo o momento. E acabar com a censura. Ou seja permitir uma informação livre, heresia absoluta num sistema que fazia do controle da informação a pedra chave da luta pelo socialismo. A segunda pedra dessa “revolução” seria, deveria ser, teria de ser, a partilha do poder entre o Partido Comunista e outras organizações.
E era disso que se tratava. A primavera desagua no verão como se sabe, e as medidas tomadas por Dubcek, a pressão da rua, a mobilização da sociedade civil, a calma severa com que tudo se passava, faziam as autoridades dos países irmãos temer pelo pior. E provavelmente seria o pior que viria. Na óptica deles, claro.
Dubceb e Svoboda por seu turno acreditavam numa evolução pacífica do regime, numa adaptação dele que não pusesse em causa a direcção do PC. E essa é uma das ironias desta história trágica. Eles eram os únicos que acreditavam numa saída pacífica para a crise. Soviéticos, polacos, húngaros, alemães e búlgaros, estão convictos do contrario. E desta vez não deixarão os camaradas soviéticos sozinhos como em 56 na Hungria. O pacto de Varsóvia que nunca serviu para atacar o inimigo ocidental teve esta única e irrepetível aplicação prática: atacou o país que pretendia ensaiar um novo modelo de socialismo e de passo perpetuar um sistema em que os seus dirigentes, ingenuamente, acreditavam. Depois disso, ser comunista no ocidente foi, digamos, muito mais difícil. Para muitos militantes de esquerda foi mesmo impossível. Por uma questão de honra, de ética e de fé no socialismo.
Em que daqui a cem anos ninguém acreditará
Nessa altura será compreendida a revolução nosso túmulo
E os que manipulavam o rádio
Vitezlav Nezval
(em memória de V. I. Lenin, “Pantomina”, 1924 – recolhido em Prague aux doigts de pluie, Éditeurs Francais Reunis, Paris, 1960)
Os leitores perdoarão a pequena ironia da citação que abre este texto sobre 1968 nos países do “outro lado”.
Convenhamos que, agora, é difícil compreender o panorama político e social da Polónia, da Checoslováquia e da Jugoslávia nesse longínquo ano de 68. Aliás juntar três realidades tão diferentes é um risco que se assume mas que se espera justificar. Pretende-se apenas mostrar como é que um regime mais ou menos idêntico em três países responde a reclamações que de início eram extremamente moderadas e não o punham em causa.
Comecemos pelo caso polaco.
Tudo começou pela proibição da peça “Os antepassados” de Mickiewicz, autor do século XIX, cuja peça é um manifesto contra a política czarista, numa época em que a Polónia estava ocupada pela Rússia.
A época não estava para zurzir no grande irmão mesmo que os odiados czares já só fossem passado. E não estava porque, no caso em apreço, a Polónia era governada por Gomulka, um comunista discretamente anti-russo mas suficientemente cauteloso para não permitir que no seu país se instalasse uma desordem idêntica á que grassava na vizinha Checoslováquia.
Depois, assistia-se, nos circuitos internos da inteligentsia polaca a uma ofensiva “anti-burocrática” de que a “Carta ao Partido Operário Unificado Polaco” de Kuron e Modzelewski era o mais recente exemplo.
Em termos muito gerais, a batalha que se travava nas universidades polacas tinha muito a ver com a liberdade de expressão que, estranhamente tinha feito uma breve aparição na Polónia na sequência da contestação de Bierut e na ascenção de Gomulka. Jornais tinham aparecido (por todos Po Prostu) grupos de discussão e os famosos “Conselhos Operários”. Todavia, logo que a nova situação se estabilizou, as coisas voltaram ao ritmo anterior. Po Prostu foi silenciado, os conselhos foram descritos como um desvio anarquizante e as centenas de militantes que se tinham revelado começaram a ir para a prisão.
A elaboração do manifesto de Kuron e Modzelewski, resultado iasás de múltiplas contribuições e reuniões, respondia a esse ataque ás liberdades um tempo reencontradas.
A peça de Mickiewicz, apareceu no momento errado e sobretudo a sua estreia ocorria durante o desenvolvimento do processo checo. Se se acrescentar que o ambiente económico era pouco entusiasmante, logo se percebe que estavam reunidas as condições para uma explosão universitária que para ter êxito precisaria de apoio nos meios sindicais e nas fábricas.
Algumas greves esporádicas terão entusiasmado os estudantes que ocuparam algumas universidades e saíram para a rua. Mas os operários ficaram quietos e o fogo que ameaçava consumir a nação polaca foi apagado como fogo de palha que ao fim e ao cabo foi. Em Maio o movimento estava extinto. Gomulka poderia continuar a governar reprimindo aqui, diminuindo a pressão acolá. Durou mais vinte anos.
Na Jugoslávia, país tecnicamente não enfeudado a Moscovo, com liberdades inimagináveis para os habitantes do bloco de leste (liberdade de emigrar, de viajar, de criar empresas privadas etc..., o movimento tem origem num facto sem qualquer importância: uma rixa entre estudantes e uma brigada empenhada numa “acção de trabalho”.
A milícia intervém e os estudantes apanham pela medida grande. No dia seguinte são milhares a desfilar desde a cidade universitária nos arrabaldes até ao centro de Belgrado. Nova intervenção da milícia e novos combates de rua.
A greve universitária é proclamada, as faculdades são ocupadas e o já clássico Maio repete-se aqui em Junho.
A imprensa apodera-se do assunto. Os estudantes barricados sobem o tom das suas criticas. Não é só a intervenção da milícia que é criticada mas também as insuficiências do ensino, a falta de saídas profissionais para os licenciados, a “burguesia vermelha” de Belgrado e a falta de solidariedade internacional com os Vietnam e a revolução mundial.
Do lado do poder as acusações também não faltam: partidários de Djilas, saudosos do antigo regime monárquico, trotskistas ou, inimigos da Federação!, isto é nacionalistas pequeno-burgueses.
Finalmente, quando se pensaria que a situação atingia o paroxismo e que se assistiria a uma repressão selvagem, Tito, chefe indiscutível, que forjara o seu poder na resistência aos invasores alemães e na oposição à União Soviética, intervém e salomonicamente declara encerrado o conflito: a maioria dos estudantes é sã e tem razão. A culpa dos acontecimentos é toda de uma ínfima franja de anarquistas, da falta de cuidado da polícia e da situação internacional.
A intervenção dos “irmãos de armas” comunistas na Checoslováquia e a brutalidade com que é feita perante um vago e comedido protesto ocidental, convencem estudantes contestatários e autoridades diversas a esquecer afrontas antigas e fingir que tudo vai pela melhor no melhor dos mundos. Não ia, como já Voltaire provara dois séculos antes.
E agora, a excepção: Excepção porque no caso checo não se trata de uma revolta juvenil com maior ou menor ressonância na população. Não está em causa a oposição aberta ao regime mas algo mais profundo mesmo que isso nos pareça ridículo. É de independência nacional que se fala. De facto a queda de Novotny e a relativamente longa experiência de gestão de Dubcec como dirigente comunista, não faziam prever á partida nada mais do que uma mudança de equipa forçada pelas circunstâncias.
Nunca saberemos como é que um comunista eslovaco, educado na URSS, ex-resistente e homem do aparelho chegou á conclusão que era preciso temperar o vinho velho do comunismo em uso no leste. Levar a destalinização um pouco mais longe. Bastante mais longe, se entendermos por isso pedir a intervenção das massas na condução dos negócios públicos. E permitir o escrutínio de toda a actividade do Partido pelo povo, a todo o momento. E acabar com a censura. Ou seja permitir uma informação livre, heresia absoluta num sistema que fazia do controle da informação a pedra chave da luta pelo socialismo. A segunda pedra dessa “revolução” seria, deveria ser, teria de ser, a partilha do poder entre o Partido Comunista e outras organizações.
E era disso que se tratava. A primavera desagua no verão como se sabe, e as medidas tomadas por Dubcek, a pressão da rua, a mobilização da sociedade civil, a calma severa com que tudo se passava, faziam as autoridades dos países irmãos temer pelo pior. E provavelmente seria o pior que viria. Na óptica deles, claro.
Dubceb e Svoboda por seu turno acreditavam numa evolução pacífica do regime, numa adaptação dele que não pusesse em causa a direcção do PC. E essa é uma das ironias desta história trágica. Eles eram os únicos que acreditavam numa saída pacífica para a crise. Soviéticos, polacos, húngaros, alemães e búlgaros, estão convictos do contrario. E desta vez não deixarão os camaradas soviéticos sozinhos como em 56 na Hungria. O pacto de Varsóvia que nunca serviu para atacar o inimigo ocidental teve esta única e irrepetível aplicação prática: atacou o país que pretendia ensaiar um novo modelo de socialismo e de passo perpetuar um sistema em que os seus dirigentes, ingenuamente, acreditavam. Depois disso, ser comunista no ocidente foi, digamos, muito mais difícil. Para muitos militantes de esquerda foi mesmo impossível. Por uma questão de honra, de ética e de fé no socialismo.
8 comentários:
Paradoxalmente, em Portugal, a falta de liberdade de expressão do Estado Novo salazarista/caetanista, foi o seguro de vida dos comunistas de então.
Em nenhum país europeu, o PC, foi tão influente, como em Portugal, por causa disso.
O PCP até devia agradecer ao Salazar o ainda ser um partido de "quadros", com uma militãncia impressionantemente leninista, com laivos estalinistas.
Se não fosse isso, o PCP, estaria reduzido às cinzas da História- essa é que é a verdade.
O comentário do josé é extraordinário. Na mesma linha de pensamento alguém escreveu, não me lembro onde, que Israel deve a sua existência a Hitler. De facto, o militantismo absurdo só pode gerar um absurdo maior.
Pois será extraordinário, mas não tem paralelo no exemplo dado, pelo seguinte:
Em França, em 1968, o PCF não teve qualquer papel de relevo, porque até o mito de então, Aragon, foi cilindrado pelos activistas libertários.
Por outro lado, a liberdade de expressão em França, permitiu que as pessoas vissem, soubessem e desfizessem os mitos dos amanhãs a cantar que por aqui perduraram e, pelos vistos, ainda perduram. Sempre com base na mesma utopia, justificada agora no seguinte raciocínio: as ideias estão certas; a prática é que se calhar ( ainda não têm a certeza...) é que esteve errada.
Na Itália, o PCI, teve o mesmo destino pelos mesmos motivos: na ausência de obscurantismo, as ideias circulam e as pessoas ficam a saber quem é o quê.
Por cá, o PCP, durante anos a fio, mitificou-se como o partido dos trabalhadores ( não havia outro, do mesmo modo) e da verdade.
Muita gente ainda hoje considera o PCP um partido de ideias respeitáveis.
Basta ler O Militante, para perceber que ideias são essas.
Assim, o obscurantismo salazarista, tanto vituperado pelos comunistas, foi mesmo um obscurantismo, mas pelas razões que nem eles se lembrariam de enumerar.
Uma delas é esta que escrevi no comentário: o PCP só vicejou em Portugal, por causa da ditadura. Apenas por isso.
Em boa lógica, até deveriam agradecer ao Salazar.
E na verdade, historicamente, como é que nasceu e quando, o estado de Israel.
E já agora falta o porquê.
Se alguém escreveu que tal se ficou a dever a Hitler, não errou de todo, porque foi a partir do Holocausto e da II Guerra que se ponderou a necessidade de um estado para um povo em diáspora.
Não vejo nada departicularmente absurdo nesse facto.
A II Guerra, ( Hitler, no fim de contas porque foi ele quem a provocou), foi causa directa de muita coisa.
Por exemplo, da guerra fria, da cortina de ferro, da importância dos PC´s a partir daí, etc etc.
Por exemplo do Plano Marshall, que Portugal não aproveitou, porque sabia que teria consequências, a nível de Ultramar.
Logo, Hitler, é uma figura charneira do séc. XX, por várias razões.
A criação do Estado de Israel, é apenas uma delas
Parece-me que se está a confundir coisas distintas. O facto de Hitler ter desencadeado a Guerra e desta ter gerado as condições que levaram à perseguição dos judeus e de outros povos não faz de Hitler a causa que teve como efeito a criação do Estado de Israel.
Do mesmo modo, o facto do regime salazarista perseguir o PC não faz de Salazar o abono de família dos comunistas. Anoto que não duvido que a luta contra o regime fortaleceu o PC.
Contudo, o raciocínio que faz é uma autêntica falácia. Se fizesse algum sentido o que defende, então, quando hoje algumas organizações israelitas exigem que a Alemanha indemnize os judeus vítimas do nazismo, seguindo a sua lógica, o governo alemão deveria responder que Israel deve a sua existência à Alemanha, logo nada há a pagar. Parece-lhe que isto faz sentido?
Indo por partes
O PC sobreviveu com enormes dificuldades e sacrificios ao cerco do regime. Não ficou melhor nem pior por isso. Pode até ter ficado pior dada a sangria de militantes que sofreu. Talvez com "Pavel" tivesse tido um percurso diferente...ou com Alex ou com Dias Coelho.
digamos que a repressão apenas teve um efeito (e mesmo esse discutível): reforçou a "bolchevização" do Partido.
Nada indica que se o PC se tivesse convertido ao euro-comunismo não seria ainda hoje forte. discutir sobre o tamanho do nariz de Cleópatra é um exercício inútil.
A questão de Israel e da criação de um Estado começou com a Declaração Balfour em 1917 se não estou em erro. A partir daí o movimento sionista deu por certo que o Lar Nacional Judaico seria criado na Palestina. Para o efeito começou a enviar colonos judeus para lá, a comprar terrenos e a apoiar financeiramente os kibutz e os moshav que lá se criaram. No início da 2ª G. Guerra já havia largas dezenas de milhares de judeus na Palestina. E tinham organizações para-militares, sindicais, políticas, grupos terroristas (o Stern por exemplo) além de um esboço de exército secreto. Milhares de judeus alistaram-se no exército britanico do Egipto não só para combater o boche mas sobretudo para adquirir experiencia militar.
ou seja: já havia um proto-estado judeu baseado na promessa britãnica, no milenarismo judaico, no sionismo militante. Depois em 44-48 apenas foi ocorrendo uma emigração em massa para a Palestina.
convenhamos que se Hitler contribuiu para isto foi apenas porque não matou todos os judeus.
Exactamente como Salazar não contribuiu para o fortalecimento do PC ou os americanos para a vitória final de Hanoi. Ou os portugueses para a independencia de Angola.
A história é uma coisa demasiado séria e demasiado complexa para ser redutoramente tratada como parece ser o caso da hipótese de José.
Preferiria dizer, a respeito da força (decrescente) do PC que ela traduz a ausência gritante de uma alternativa burguesa, conservadora forte ao salazarismo medíocre. De facto a oposição liberal e democrática era um susto e uma perda de tempo. eu que andei metido nisso desde 1960 bem que o posso testemunhar. Nem mesmo os católicos tiveram grande importancia até 1970/1. aquilo era assim: ou o PC se mexia ou ninguém dava um passo. Já agora: nunca fui do PC mas não posso só por isso tirar-lhe o mérito. ele era a única organização forte, o resto, nós, era paisagem e gestos heroicos e isolados.
Não percamos o contexto da discussão. Deixemos o caso de Hitler, de fora. Mas com uma ideia de base: a causa da causa é a causa do causado.
Sobre o PCP, parece-me improvável que o PCP e a Esquerda em geral, tivessem a importância que ainda têm, se por acaso Portugal, em vez do salazarismo, tivesse um regime de liberdade de expressão e associação.
O regime reprimia o comunismo e contribuia para a mitificação do mesmo, com a repressão à divulgação das suas ideias.
Em França, nem o Aragon teve sorte, no Maio de 68. Mal levantou p pouco cabelo que tinha, levou logo água pela barba, dos anarcas e libertários.
Por cá, o PCP manteve-se um mito, mesmo depois de se saber o que se sabe e que muitos só quiseram saber, depois dos anos noventa.
Ainda hoje desculpam, contextualizam e dão importância política ao PCP que se manteve igualzinho e idêntico ao que era há trinta anos.
A explicação para tal, quanto a mim, é a que dei: o salazarismo foi o seu seguro de vida mais duradouro. Ainda dura, com a treta do "fascismo" e outras que tais.
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