18 outubro 2008

O leitor (im)penitente 40


Ramiro Fonte

Conheci-o na Póvoa ou em Matosinhos já não estou certo nem isso interessa muito. Tinha acorrido à chamada fraterna do Francisco Guedes esse agitador cultural que tem criado pontes entre escritores e público que vão muito mais longe (e muito mais fundo) do que dez Ministérios da Cultura juntos.
O Ramiro era um homem de cultura e de convicções. Dizia alto e claro ao que vinha. Não poupava elogios e não era meigo nas críticas. Fora isso gostava de comer bem, de ler e de Portugal. E de alfarrabistas portugueses, sobretudo de Lisboa, que ele frequentava amiúde, comprando os tesouros que a incúria, a preguiça e o desinteresse nacionais deixavam por aí esquecidos. Sabia de literatura portuguesa mais do que 99% dos portugueses. Lia os nossos (e dele) autores com paixão, com rigor e sempre surpreso. Ah que dias (aliás noites...) de conversa! E que paixões comuns, o Raul Brandão, por exemplo...
Combinámos mil encontros numa das minhas vindas a Lisboa. Mas eu esquecia-me sempre de trazer o cartão com o número de telefone dele... Agora já não serve.
Morreu subitamente em Barcelona. A notícia caiu-me brutal no El País de domingo passado. A Laurinda e o Manel Simas quando chegaram ao café viram-me com cara de caso. Falei-lhes nele e na falta que vai fazer. Depois fui até casa, escrevi um texto curto mas a internet falhou quando o tentava "postar".
Hoje, a Maria Manuel Viana manda-me um mail com a fotografia e o poema. E perguntava-me se eu já sabia. Sabia mas, com a vinda para Lisboa, e mais três futilidades, esquecera o post adiado. Sai este à pressa e que os deuses da internet permitam que siga. Não se diga que o Ramiro desaparece sem uma notícia mesmo breve mas sincera. Lembrem-lhe o nome. era galego, poeta, e amava a nossa literatura como muitos de nós a não amamos.



Promesa

Quizá fuesen mejores
nuestros corazones cando eran frágiles
y algún golpe de mar, o la noche de júlio
pudieran abrir las calladas heridas
que ahora, y para siempre, llamaremos nostalgias.
Quizá fuesen mejores cando eran
cual regatos ligeros o lluviosas tardes
que mojaban la infância y partian
un domingo común; un valle abierto,
imensos arenales, aquel balcónn
detenido en la presencia de pulidos gerânios.
No eligieran barcos para partir lejos;
ni la brisa liviana de un verano
para que los apagase, con su fuego insumiso.
Semejantes a los hombres, desearon
a los árboles antiguos de esta tierra.

(in A Origen das Espécies 12/10/2008)

3 comentários:

M.C.R. disse...

Depois de escrever à Maria Manuel a dizer que ia aproveitar o mail dela, venho a saber que ela o tinha transcrito do blog do Francisco José Viegas, um bom amigo.
Ó Francisco, desculpa lá a pirataria mas eu não podia deixar passar em branco a morte do Ramiro.

Albino M. disse...

Aqui fica, com os melhores cumps.,
linque relativo a Ramiro Fonte, com versinho+sinopse:

http://ruadaspretas.blogspot.com/2008/10/el-enemigo-cuando-ests-un-poco.html

Abc.

M.C.R. disse...

Caro Albino
já estou seu freguês. bom blog, boa leitura, um abraço