11 novembro 2008

Diário Político 91


Cambalhotas, batotas,
petas e lorotas


O país viu cento e vinte mil professores manifestarem-se. Viu uma Ministra a uns prudentes 300 quilómetros dizer coisas surpreendentes (ou absurdas) desqualificando a manifestação. Viu o palavroso Primeiro Ministro dizer, avisar, ameaçar, que o governo tinha decidido e pronto. Era assim, Assim mesmo. Ou vai ou racha. Viu sessenta escolas darem o primeiro sinal de abandono do processo de avaliação. Hoje já devem ser seiscentas. Entretanto um Secretario de Estado, presume-se que subordinado da Ministra, já veio pôr água na fervura. A avaliação é só para daqui a um, dois, três ou mais anos (riscar o que não interessar). Outros responsáveis atiram-na mesmo para as calendas.
Em que ficamos? Em que não ficamos, para ser mais exactos?
O PS mexe-se. Sabem os socialistas menos desatentos que uma forte percentagem (quiçá a maioria...) dos professores é sua votante. Ou era. Ou será se... E vai daí, primeiro a esquerda, depois alguns, mais reguilas, lançam o alerta. Cuidado: os professores são votos. Muitos votos. Ou, pelo menos os suficientes para ganhar ou perder uma maioria, sobretudo absoluta.
Marcha atrás a todo o vapor! Tempus urgit.
E isto, esta procissão penitencial, ainda vai no adro. Os excelsos paisinhos de família, que andavam tão contentes com o milagre das rosas matemáticas, pedem serenidade. Eles também votam...
À hora em que escrevo, não sei se há ainda Ministra. Nem me interessa. Esta Ministra já caiu. Só que não sabe. Pode ser que só dê por isso daqui a meses mas politicamente é um zero. Porventura sempre o foi.
A propósito disto, desta fronda dos professores, há quem fale em corporações. Em privilégios corporativos defendidos a outrance. Nada mais errado. Se há coisa que nunca houve nesta democracia adolescente e frágil é corporações. Isso são coisas de país rico onde as profissões se defendem, onde o mínimo ataque ao status quo só acontece depois de pesados todos os prós e contras. Se os professores, ou os juízes, ou os funcionários públicos fossem efectivas corporações (ou seja, se tivessem interiorizada uma determinada situação, com os seus privilégios, os seus deveres e direitos, uma “consciência de classe”) onde o poder já não ia... É justamente porque as “corporações” não o são nem têm essa força que ,até agora, a bola tem estado do lado do poder. Deste poder.
Há em Portugal, conexo com um forte analfabetismo político e social, o sentimento que nomear uma coisa pela palavra que primeiro nos vier à cabeça transforma essa coisa no significado da palavra. É assim que se caracteriza uma situação anómala sob o termo de “surrealista”; é assim que o vago receio ou o desânimo são apodados de tremendismo; é assim que se confunde maioria absoluta com poder absoluto como se os povos, os paisanos só aqui andassem para votar de quatro em quatro anos num punhado de criaturas escolhidas a esmo entre os obedientes que levantam e baixam o cu à ordem da primeira fila da bancada parlamentar.
O facto de um governo ter legitimidade obtida nas urnas não significa nem pode significar que todos os seus actos são legítimos, justos ou se destinam a defender o bem comum. Um governo legítimo e legal pode, por razões as mais variadas, cometer autênticos crimes ou infâmias insondáveis. Assim foi com a guerra do Vietname, com a invasão do Iraque para citar dois exemplos inquestionáveis. Lamento não poder chamar à colação a Rússia mas não me parece que esse regime seja aquilo que nós entenderíamos como democrático (e por maioria de razão a China ou Cuba).
O folhetim continua ...
d'Oliveira

* entendi pôr um Signac a ilustrar este texto. É provável que as autoridades desconheçam o nome, a obra, a época ou a escola pictórica de Signac. Prova que são já obra do não ensino que propagandeiam...

Sem comentários: