01 março 2005

Gosto de andar na estrada

Gosto de andar na estrada, no exacto sentido em que o afirmam por exemplo os músicos. Também gosto de áreas de serviço das auto-estradas, de aeroportos, de hotéis de passagem. Mas essa é outra psicanálise.
Cheguei a Figueiró dos Vinhos, depois de atravessar um túnel de nevoeiro entre Condeixa e o Avelar até que já com sol estacionei o carro junto ao Casulo do Mestre Malhoa, do arquitecto Ernest Reynaud, onde o pintor viveu, e morreu em 1933, em frente do qual foi mais recentemente construído um mamarracho que dá pelo nome de Palácio da Justiça.
“Gritos Mudos” era o nome do encontro temático da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens. O auditório do Clube Figueiroense - Casa da Cultura cheio com os 200 participantes. Fiquei espantado! À espera, pois nada se inicia sem que chegue quem vem de Lisboa, e quem vem de Lisboa orienta-se mal quando tem de se aventurar pelo interior do lado direito da A1.
Lembro-me de aqui ter estado quando eu era miúdo e Figueiró dos Vinhos um dos vértices do triângulo da indústria de lanifícios, com os armazéns e as fábricas em Castanheira de Pêra e no Avelar. Hoje tem um dos dezasseis que já teve e uma fábrica de confecções timidamente reaberta.
Foi o fim de um ciclo, curto, de debates sobre a violência doméstica, do qual saí ainda mais esclarecido sobre a pobreza económica, social e cultural que embebe os alicerces do país. No fim do qual fiquei também a perceber ainda melhor o que Eduardo Lourenço queria dizer ao falar da “espécie de prótese, de tipo novo, uma espécie de novo riquismo” que, na falta de formação de base, constituirá o “famoso “choque tecnológico”; e o que Pacheco Pereira queria dizer ao falar da “memória da pobreza” que nos tolhe – na conversa a dois sobre Portugal que “A Capital” de 20 de Fevereiro publicou, e que vale a pena ler.
Depois do almoço, em que o lombo de porco foi acompanhado por vinhos do Ribatejo porque Figueiró já só os tem no nome, ainda desci, agora por um túnel amarelo vivo de acácias mimosas em flor, até à Foz do Alge, e dei uma espreitadela à desoladora barragem sequiosa do Cabril. Decidi que não era prudente aproximar-me demasiado de Castelo Branco e lá fiz de novo Avelar, Penela, Condeixa, Coimbra, 7 m2.
Foi no dia 24 de Fevereiro.
Lembrei-me de quando fazia Coimbra, Condeixa, Penela, Avelar, Alvaiázere, no final de 1987, e daquela senhora que me quis oferecer uns queijos do Rabaçal.
Conto depois!
Ah! Desta vez, contrariando recomendações que não posso dizer que não conheço, aceitei um pão-de-ló especialidade da terra. Desculpem-me, mas não quis parecer mal-educado.

1 comentário:

Kamikaze (L.P.) disse...

Mais uma belíssima crónica do MPTT
(Ministério Público Todo o Terreno). Parabéns :)