06 março 2005

Abandono

Por teu livre pensamento
Foram-te longe encerrar.
Tão longe que o meu lamento
Não te consegue alcançar
E apenas ouves o vento
E apenas ouves o mar.

Levaram-te a meio da noite:
A treva tudo cobria.
Foi de noite, numa noite
De todas a mais sombria.
Foi de noite, foi de noite,
E nunca mais se fez dia.

Ai dessa noite o veneno
Persiste em me envenenar.
Oiço apenas o silêncio
Que ficou no teu lugar.
Ao menos ouves o vento!
Ao menos ouves o mar!


David Mourão-Ferreira

(Este poema, cantado por Amália Rodrigues, ficou conhecido como Fado Peniche, numa alusão aos prisioneiros políticos do Forte de Peniche)

2 comentários:

Silvia Chueire disse...

Obrigada, LC, pelo poema trazido.
Abraço,
Silvia

Primo de Amarante disse...

A poesia tem mais alma, quando sabe sofrer com os que sofrem, quando diz não ao arbitrio e quando manifesta amor à justiça, à liberdade e dignifica a humanidade. Esta é a poesia que melhor eco enconra na minha sensibilidade. O valor da poesia não é só, para mim,uma questão de gosto, mas também de luta.