24 fevereiro 2006

carnaval III

(um entrever de como são as coisas)


enfunam-se as velas da nau erguida e orgulhosa , sobre o caminhão do desfile, no carro alegórico. piratas de seios à mostra, índias vestidas de penas de pavão. navegadores, cabrais e colombos, seguem-nas encantados e mostram suas fantasias, vaidosos e alegres, à multidão.

alinham-se no asfalto, nobres e plebeus , palhaços e africanos, baianas e porta-bandeiras, que dançarão o sonho deste ano. o sonho que muitos ainda não sabem.

tudo principia num canto repetido do samba mais famoso da escola , sem o auxílio da bateria.
à capella, a escola inteira canta emocionada. depois vem o canto ritmado do samba do ano, ainda sem a bateria. acompanham-nos apenas cavaquinho, violão e uns tamborins, e a voz do "puxador" do samba no carro de som. tudo que parecia finito e calmo agora estremece na excitação que surge nas vozes e nos olhos.

fogos de artifício.e de inopino o grito de guerra : explóóóóde salgueeeeeiiiro... ! ouve-se muito alto e muito longe o eco. ouve-se na alma pasma de repentino amor. mesmo para os apaixonados de longa data , a renovação do amor, da paixão.

e entram todos os naipes da percussão, absolutamente afinados, ao mesmo tempo : pam-pam ,pampampam-papapapapapapam, disparados ao encontro de todos os corações, de todos os estômagos, de todas as artérias, que inocentes esperavam mais ou menos alinhados, entre brincadeiras , cervejas , risos, e ajeitar na última hora as fantasias.

um espanto, um arrepio! a vida injetada nas veias musicais , e a certeza de que ali começa a nossa luta pela vitória. que depende de todos e de cada um de nós. todos igualados pela paixão, repentina ou não. todos sabemos que a escola tem que ganhar.vcorpos, vozes, quadris, sorrisos , a afinação mais perfeita. o frisson sob controle, precário controle, na linha limite.

a serviço da vitória somos todos transformados em atletas, em soldados - como deviam ser os soldados- em putas e vagabundos, em passistas e malandros, no entusiasmo de construir o desfile sambando pela avenida ao encontro do público- nosso público- dos jurados, e da vitória.

cada requebro , cada face esplendorosa, cada pessoa a carregar um chapéu como se não pesasse. cada quadril sensual que explode com a escola, cada voz, cada mover ágil dos pés como nunca o fizemos na vida, no chão ou nos carros alegóricos, cada um vencerá no final, terá dado tudo de si. a bateria da escola tocando nas nossas almas, em nossas artérias. ali somos apenas ritmo, canção, impulso. e uma imensa alegria de viver.

ah..mal sabem os que assistem àquilo que parece ser apenas repetição, que o espetáculo não é deles, nem para eles. é nosso, só nosso. com eles somos apenas generosos, porque nesta hora generosidade não nos falta e nossa escola precisa ser campeã.


silvia chueire

2 comentários:

M.C.R. disse...

mcr passou por aqui, gostou mas, para se não repetir, escreveu "Olá, Sílvia".

Silvia Chueire disse...

Olá, MCR ! : )